ERA UMA VEZ UM GÊNIO | UMA FÁBULA ADULTA SOBRE AMOR E DESEJO

Dr. Alithea (Tilda Swinton) é uma autoproclamada “narratologista”, uma acadêmica especializada em estudar as estruturas narrativas. Ela ama histórias e sabe bem a importância de um bom storytelling, não é à toa que Alithea é a primeira narradora dessa história e opta por contá-la como um conto de fadas, apesar de garantir que se trata de uma história verídica. Mesmo com toda sua intimidade com histórias de ficção, mitos e fantasia (e até experimentar algumas visões que ela associa puramente à sua mente ocupada), Alithea é uma mulher cética. A acadêmica é solteira e solitária, convencida de que sua própria companhia é mais do que suficiente para levar a vida. Em uma viagem para Istambul – a trabalho, é claro – Alithea visita uma feira local, encontra “aleatoriamente” um pequeno frasco decorado que ela acredita ter visto muito história (apesar de não a conhecer) e decide levar pra casa, ou melhor, para seu quarto de hotel. Lá, ao tentar limpar o frasco, sai dele Djinn (Idris Elba), um gênio da lâmpada.

Primeiro Djinn aparece em sua forma real, quase ocupando todo o espaço do grande quarto de Alithea, mas depois se reduz a um tamanho humano, apesar de manter as orelhas pontudas que denunciam sua origem “sobrenatural”. Alithea fica surpresa, mas não chega perto de ficar tão surpresa quanto qualquer outra pessoa ficaria. Como forma de agradecimento por ter sido libertado do frasco que o aprisionava, Djinn concede os clássicos três desejos à Alithea, mas nem isso tira a acadêmica de sua “apatia”, pelo contrário, só desperta seu senso de alerta: Alithea tem vasto conhecimento de contos sobre gênios e sabe muito bem que nenhum desejo vem sem um efeito colateral para ensinar que você deve ter cuidado com o que deseja e nem tudo é o que parece ser e etc, etc etc. Mas Djinn não se dá por vencido, ele precisa realizar três desejos para manter sua liberdade no nosso mundo. Ainda desconfiada, Alithea quer conhecer melhor sua nova companhia antes de pensar em pedir por alguma coisa, então Djinn decide compartilhar a história das vezes em que foi aprisionado.

Dirigido por George Miller, que você conhece desde filmes como Happy Feet a Mad Max: Estrada da Fúria e também assina o roteiro, adaptado de um conto de A.S. Byatt, junto com sua filha Augusta Gore, as histórias do Djinn são um espetáculo visual e fantasioso (e que depende de computação gráfica em sua maior parte), claramente fruto da imaginação inquieta de Miller. As histórias de Djinn passam por três mil anos de eventos históricos, em diferentes cenários e civilizações, desde seu encantamento pela Rainha de Sabá até o império otomano. Durante os dois primeiros atos, as memórias são narradas pelo próprio Djinn, o que nos distancia um pouco dos personagens dessas memórias, e os flashbacks são intercalados com o quarto do hotel nos dias atuais.

Como os próprios personagens ressaltam, as histórias vividas por Djinn parecem fábulas e o próprio filme acaba se assemelhando a uma fábula para adultos também. É uma forma interessante de apresentar uma trama, mas quando consideramos a importância que é dado e reconhecido ao storytelling, acaba deixando a desejar. Os contos do passado pouco têm a ver com o momento em que Alithea e Djinn compartilham e é só no terceiro ato que temos uma interação realmente cativante e bonita entre os dois, ao mesmo tempo que esse ato é o mais realista, nos levando com Alithea para sua casa em Londres.

Os contos são mágicos, mas as atuações não ficam para trás, Idris Elba e Tilda Swinton podem não ter a maior química romântica, mas ambos são ótimos no que se propõem, ela como mulher independente e literal, ele como um gênio emotivo e sensível trazendo uma história com bonitas reflexões sobre amor, desejo e humanidade. E fica praticamente impossível imaginar qualquer outro ator nesses papéis, assim como é impossível pensar que esse filme teria saído como saiu se não fosse um trabalho tão pessoal para Miller.

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