Jogos Vorazes: A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes
Diretor
Francis Lawrence
Elenco
Tom Blyth, Rachel Zegler, Viola Davis
Roteirista
Michael Lesslie e Michael Ardnt
Estúdio
Paris Filmes
Duração
157 minutos
Data de lançamento
15 de novembro de 2023
No geral, vejo com maus olhos quando adaptações cinematográficas transformam um único livro em um filme de duas partes, isso porque, na maioria das vezes, não passa de uma manobra de marketing com intuito de lucrar com a franquia até o último centavo possível. Jogos Vorazes: A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes foi o primeiro filme a me fazer sentir exatamente o oposto. Quem é fã da saga e leu os livros sabe que esse último, lançado em 2020 (dez anos depois do fim da trilogia original), é o mais longo de toda a saga, com uma história dividida claramente em duas tramas distintas, coisa que se traduziu para o filme. Com 2 horas e 40 minutos de duração, poderia ser um filme cansativo, mas não é. A primeira parte é muito bem trabalhada, já a segunda poderia ser mais extensa, e facilmente ser um novo filme, trazendo alguns pontos mais detalhados e mergulhar nos momentos que transformaram Coriolanus no Snow que conhecemos na saga original. Mas deixar um gosto de “quero mais” diz mais em relação à qualidade do filme do que à falta dela. Como uma fã de longa data de “Jogos Vorazes”, a adaptação desse spin-off fez jus à saga que pode ser considerada uma das melhores de seu segmento.
O sucesso dos primeiros filmes, tão marcados pela presença de Jennifer Lawrence e de Josh Hutcherson e seus respectivos personagens, tem seus prós e cons para essa “sequência” (que na verdade se passa mais de 6 décadas antes da história de Katniss), que vem com o enorme desafio de impressionar sem a presença de suas já conhecidas estrelas. Apesar de Snow ter aparecido na trilogia original, aqui ele é completamente diferente – e 60 anos mais jovem. Corialonus Snow (Tom Blyth) cresceu com uma Capitol pós-guerra, com 18 anos ele está se formando na escola e em busca de um prêmio dado ao melhor aluno que pode pagar sua ida a faculdade, já que a família Snow está falida desde a morte de seus pais, mas Coriolanus esconde de todos esse fato. Ele mora com a avó (Fionnula Flanagan), que acredita que ser rica é um direito da família e sua prima Tigris (Hunter Schafer), que é sua consciência e espera por um mundo melhor para todos, não só para os Snow, mas Snow é a esperança da família recobrar o prestígio que um dia teve e ele leva a sério essa “missão”, se destacando em todos os campos de sua educação.
Nesse momento, os Jogos Vorazes ainda estão em fase de experimentação, longe de ser o evento grandioso que conhecemos, e Coriolanus tem uma participação essencial em transformar os Jogos no que eles se tornaram décadas depois, auxiliando a Dra. Volumnia Gaul (Viola Davis), uma das idealizadoras das provas e regras dos Jogos. A princípio, a motivação de Coriolanus é puramente “egoísta”, ele não é necessariamente a favor da barbárie, só está disposto a fazer o que quer que fosse para se destacar e conseguir o prêmio, mas seus planos são colocados à prova quando ele é nomeado mentor de um dos tributos e conhece a jovem e irreverente Lucy Gray Baird (Rachel Zegler). Ela é um dos tributos do Distrito 12, mas logo informa que é uma pessoa livre, inclusive de endereço; ela é uma cantora num bando que vai de um lugar para o outro levando sua música para quem quiser – e precisar – ouvir. Coriolanus, assim como todo o resto de Panem, percebe que Lucy Gray é uma menina especial e sua autenticidade pode ser capaz de levá-la longe nos Jogos.
O que começa como uma relação de interesse vira uma relação de amor, fazendo nascer conflitos morais para Coriolanus, para Lucy Gray e para o destino dos Jogos. O romance é constantemente perturbado pelo caráter dúbio de Coriolanus, tanto que é difícil decidir se torcer pelo casal é a coisa “certa” a se fazer, mas essa é também a essência dos Jogos Vorazes como saga e essa ambiguidade é bem-vinda. Outro símbolo da saga é uma personagem feminina determinada e com grande senso de sobrevivência, talvez Lucy Gray nunca será uma Katniss, mas isso não significa que ela não preenche os requisitos. Ela é uma menina forte e resiliente, segura de si e do que acredita do mundo e uma decisão acertada do diretor Francis Lawrence foi utilizar a voz poderosa de Rachel para enfatizar o poder e magnetismo de Lucy Gray. A música já teve um papel importante nos primeiros filmes, mas aqui se tornou essencial, inclusive para o andar da narrativa. É um elemento interessante para deixar uma marca única – e independente da saga original.
Jogos Vorazes: A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes tinha uma grande responsabilidade e altas expectativas a serem alcançadas, mas em vez de tentar ser o novo Jogos Vorazes, pegou o caminho para ser uma parte importante desse universo sem ter que substituir nada nem ninguém. Principalmente por ser uma “prequela”, é impossível que seja tão relevante quanto os originais, mas isso não significa que sua existência seja indiferente e, certamente, é uma boa forma do fã se conectar novamente com essa história, ainda que de um ponto de vista diferente.
Por Júlia Rezende