Uma Família Feliz
Diretor
José Eduardo Belmonte
Elenco
Grazi Massafera, Reynaldo Gianecchini, Luiza Antunes, Juliana Bim
Roteirista
Raphael Montes
Estúdio
Pandora Filmes
Duração
115 minutos
Data de lançamento
04 de abril de 2024
A primeira impressão que “Uma Família Feliz” passa através de sua comunicação gráfica é exatamente o cerne de toda sua trama: as aparências enganam. Do nome à escalação, a família que conhecemos no filme é, à primeira vista, perfeita dentro de todos os padrões. O pai e marido é Vicente (Reynaldo Gianecchini), um advogado que trabalha fora e considera seu papel de provedor como suficiente dentro da família. A mãe e esposa é Eva (Grazi Massafera), ela começa a história grávida e depois que nasce o bebê, custa para se adaptar à nova vida de uma família de 5, já que os dois já tinham filhas gêmeas de 10 anos. Por mais que a “família de comercial de margarina” seja aparentemente perfeita, a primeira quebra dessa imagem acontece rapidamente, mas gradualmente se identifica. Essa desconstrução constante, presente desde a cena de abertura, que é também a cena final, abre portas para nossa desconfiança, assim como a desconfiança mútua dos protagonistas e o clima de tensão e suspense que se instala por todos os lados.
Começar a história com um final disruptivo e altamente impactante é uma decisão ousada do diretor José Eduardo Belmonte e do roteirista Raphael Montes, que acompanhou de perto o processo criativo do diretor. Ousada porque exige que o restante da história entregue um desenvolvimento à altura, uma tarefa difícil para um thriller que entrega as peças de seu quebra-cabeça aos poucos, mas ainda que não seja perfeito, o resultado é mais do que satisfatório e José Eduardo Belmonte consegue criar um bom representante brasileiro para o gênero de suspense, ainda muito escasso no Brasil. A escolha dos elementos de terror, incluindo jump scares, close-ups e a trilha sonora marcante são um trunfo para esse terror psicológico fazer uma diferença no cenário brasileiro, conduzido numa linguagem mainstream, capaz de alcançar todos os públicos, sem “simplificar” sua trama.
O roteiro de Raphael Montes (roteirista da trilogia Bom Dia, Verônica) é intrigante e possui muitas camadas, algumas mais exploradas do que outras, e o foco que ele dá para a experiência de Eva como mulher e mãe, assim como seu relacionamento com o marido pouco presente na vida doméstica, adiciona reflexões e humaniza ainda mais a personagem de Grazi Massafera, o que faz aumentar a confusão do espectador quanto seu comportamento. No processo de criar um thriller baseado na construção ilusória de imagens, o roteiro acaba se excedendo em alguns momentos em que tenta nos confundir, não que falhe nisso – somos realmente confundido, mas algumas dessas “dicas” estão ali com o único propósito de desviar a atenção, o que pode se tornar um tanto pedante e desnecessárias, já que a trama, como um todo, já é capaz de nos despistar.
De toda forma, Uma Família Feliz carrega muito mais pontos positivos do que negativos – um deles a atuação de Grazi Massafera, que mais uma vez comprova seu talento inegável num papel desafiador e exigente de diversas emoções conflitantes. Durante a coletiva de imprensa do filme, Reynaldo Gianecchini comentou sobre como seu trabalho e de Grazi foi focado mais nas emoções escondidas do que nas emoções óbvias e isso se mostra claramente nas telas. Ambos estão muito bem em seus papéis, assim como as atrizes mirins Luiza Antunes e Juliana Bim, que enfrentam cenas difíceis e incomuns para crianças de sua idade, mas entregam um trabalho satisfatório – extremamente necessário para a trama. Além de contar uma boa história, “Uma Família Feliz” também deixa uma marca por ser um grande representante de um gênero ainda negligenciado no nosso país, possivelmente abrindo espaço para novas obras dessa natureza e enriquecendo nossa indústria cinematográfica.
Por Júlia Rezende