Quando foi lançado no final da década de 90, o “found footage” (falso documentário aparentemente feito com imagens encontradas e geralmente de uma simples filmadora) de terror ‘A Bruxa de Blair (The Blair Witch Project)’ de 1999, foi uma grande surpresa para o cinema da época, principalmente por seu espantoso sucesso comercial, apesar de seu baixíssimo orçamento. Com um custo de apenas 50 mil dólares, o filme arrecadou nas bilheterias mundias, cerca de US$ 249 milhões. Durante quase 20 anos foi o filme de baixo orçamento mais lucrativo da história, sendo superado somente por ‘Atividade Paranormal’ em 2007, curiosamente outro “pseudodocumentário” de terror.
O longa-metragem foi um fenômeno entre o público, principalmente por causa da forma como foi filmado, onde cada um dos atores recebeu uma câmera com a qual tiveram que acampar durante 8 dias em uma floresta, sem saber exatamente qual era o enredo e levando sustos verdadeiros da equipe de produção, de tempos em tempos. O resultado nos apresentava em tela personagens verdadeiramente desorientados, que somado a uma narrativa que explorava o sobrenatural, ainda que apenas sugestionado, transmitia uma atmosfera de realidade muito convincente.
O sucesso de ‘A Bruxa de Blair’, também, pode ser explicado pela forma criativa como foi feita sua divulgação. Sem recursos financeiros para ações de marketing muito caras, os produtores se aproveitaram da popularização da internet para alcançar seu público. Entraram em contato com vários sites, para que os mesmos ajudassem a propagar a lenda da Bruxa de Blair e o boato de que o filme era uma história real, montada através de fitas de câmeras, encontradas em um local sinistro, e que os “protagonistas” ainda estavam misteriosamente desaparecidos. A “mentira” convenceu alguns internautas e logo se espalhou em outros sites e blogs pela internet, em uma época que não se consumia tanta informação, quanto hoje, sobre a pré-produção de filmes.
A continuação neste ano de 2016, ‘Bruxa de Blair’, chega aos cinemas visando utilizar a fama do título já conhecido, ainda que não tenha mais a pretenção de convencer ninguém da veracidade dos fatos fictícios, até por que isso seria impossível em uma era pós-internet 2.0. Mesmo assim a Lionsgate manteve a produção do filme em segredo, divulgando-o inicialmente com o título ‘The Woods’ e só revelando o verdadeiro nome durante a primeira exibição do trailer na San Diego Comic-Com empolgando o público que pôde conferir. Como qualquer sequência, a necessidade de o filme ser “continuado/refeito” provavelmente será questionada. Visto que o primeiro longa da franquia ‘The Blair Whitch Project’ tem 17 anos de idade, será que ele já precisava de uma “atualização”? Quanto tempo um longa-metragem tem que ter, para precisar de uma versão lançada para uma nova geração?
Alguns filmes envelhecem rápido, outros nem tanto. ‘A Bruxa de Blair’ é um caso singular nesta discussão, pois ele funciona bem ainda hoje, continua tendo o poder de causar medo em quem o ver, especialmente se for em uma sessão de madrugada, principalmente para um espectador que o assistir sem muito prévio conhecimento de como ele foi produzido. Sua estética “caseira-amadora” idealizada para o VHS, mídia mais utilizada para os “home video” da época, garantirá que quanto mais ele envelheça, mais estranho, esquisito e minimamente assustador ele fique para gerações futuras.
Entretanto, grande parte do público atual, que está sempre atrás de uma novidade e acostumado com as novas tecnologias digitais de gravação de vídeos, geralmente não tem interesse em um filme com mais de 15 anos. Para que os espectadores mais jovens se identifiquem e se interessem, é necessário que eles “se enxerguem” em tela. Como desde o lançamento do primeiro filme os equipamentos de produção de vídeo evoluíram muito, utilizar essa mudança é um dos aspectos positivos deste novo ‘Bruxa de Blair’.
Utilizando pequenas câmeras fixadas na parte externa do lóbulo do ouvido, que dão a mesma perspectiva em primeira pessoa do longa de 1999, além de um drone que oferece imagens panorâmicas, assim como tablets e radiocomunicadores modernos, a tecnologia se faz presente de forma muito criativa e atual. Há, também, a presença da tecnologia dos anos 90 através de uma câmera, típica da época, portada por um dos personagens, que referencia uma forma antigamente popular, mas já quase ultrapassada de filmar. Isso é justificado pela perspectiva de a narrativa ser uma continuação da história original e faz ligação direta com o primeiro longa-metragem.
Ainda que não traga nada de mais inovador do que o filme original, para os gêneros de suspense e terror, ‘Blair Witch’ funciona bem como entretenimento. O enredo é envolvente e os sustos são eficazes, assim como o efeito de causar aflição e claustrofobia em quem o assiste. A câmera presa nas orelhas dos atores, que tremem até mais do que no primeiro filme da série e fica muito próxima do rosto deles durante os diálogos, busca desorientar os espectadores e tenta causar a sensação de náusea que o original conseguia, chegando até a fazer com que as pessoas mais sensíveis vomitassem. Provavelmente essa nova versão não vai conseguir com que isso ocorra, nos dias de hoje, pois o público já está acostumado a assistir muitos longas-metragens rodados com câmeras tremidas, mas pode proporcionar uma experiência aflitiva no cinema.
A presença de Adam Wingard na direção, conhecido por dirigir alguns capítulos da antologia de terror ‘V/H/S’ 1 e 2 de 2012 e 2013, atribui a qualidade de quem tem experiência e sabe trabalhar com recursos financeiros limitados para tentar causar medo. Wingard repete a parceria com o roteirista Simon Barrett, iniciada em produções anteriores como no ‘slasher film ‘Você é o Próximo’ de 2012. Mesmo que eles se utilizem demais de recursos já bastante “batidos”, com “jump scares” em excesso, com barulhos muito altos para assustar o espectador, provavelmente vai agradar o público-alvo. O novo ‘Bruxa de Blair’ não vai ser marcante e importante para a história de cinema como foi o primeiro. No entanto, não é tão desleixado e mal produzido como ‘A Bruxa de Blair 2: O Livro das Sombras’, continuação esquecível de 2000. Ele dá um pouco mais de folego ao já desgastado gênero “found footage” ou “mockumentary” (falso documentário) de terror e pode render uma boa experiência de cinema para quem aprecia esse tipo de produção e até proporcionar um sentimento de nostalgia em quem viu o primeiro na época em que foi lançado.