Considerando tudo, “Cinquenta Tons de Liberdade” encerra a franquia (imagino) de maneira aceitável para as fãs

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Ainda bem que chegamos a um ponto em que eu não preciso mais explicar como surgiu a famosa série de livros eróticos transformada em franquia de cinema, intitulada de “Cinquenta Tons de Cinza”. Já estamos no terceiro e último capítulo da trama que acompanha o relacionamento conturbado entre o multibilionário Christian Grey (Jamie Dornan) e a garota simples e insegura Anastasia (Dakota Johnson), que atraem um ao outro praticamente à primeira vista.

Se no primeiro filme o desafio do casal era manter o relacionamento superando o grande choque de universos completamente diferentes que ambos vieram, no segundo a franquia recebeu uma nova direção (e roteirista) para tentar aprofundar melhor os dilemas pessoais de cada um: Christian confrontando fantasmas do seu passado e Ana tentando lidar com o ciúme desproporcional do parceiro e ao mesmo tempo focando na sua realização profissional.

Algo que nunca consegui compreender na franquia era a dificuldade de se criar um contexto erótico na trama. Mesmo mostrando os personagens seminus praticamente o filme inteiro, as cenas de erotismo e sexo eram pouco eficientes e mal filmadas, desperdiçando talvez a melhor coisa do filme, que era o apelo “picante” e sadomasoquista da obra (saudades thrillers dos anos 90). Lembro que quando vi que a direção da franquia havia caído nas mãos de James Foley no segundo filme, fiquei com certa expectativa, pois já conhecia o trabalho do diretor na série “House of Cards” e principalmente em um dos meus filmes favoritos, o drama “O Sucesso a Qualquer Preço”.

Sua capacidade em extrair grandes atuações do elenco havia me animado, pois a falta de química entre Dakota e Jamie, os protagonistas, havia sido justamente um dos pontos mais críticos do primeiro filme. Mas como eu estava enganado. “Cinquenta Tons Mais Escuros”, a sequência, foi um filme afetadíssimo. Roteiro, atuações e situações completamente exageradas e implausíveis, um verdadeiro “dramalhão mexicano” – no pior sentido da expressão. Essa “decepção” – na falta de palavra melhor – me fez lembrar que há filmes que quanto menos você esperar, mais pode se surpreender.

Meus gostos são peculiares, você não entenderia

Pois bem, o capítulo final da franquia chega aos nossos cinemas essa semana, intitulado “Cinquenta Tons de Liberdade”. Foley continua na direção e partindo do encerramento do filme anterior, Christian e Anastasia estão casados e vivendo o conto de fadas da lua de mel. Até que um atentado criminoso a uma de suas empresas interrompe o descanso do casal: alguém roubou informações sigilosas de Christian e pretende usar contra ele e (possivelmente) as pessoas que o acercam.

O título refere-se à liberdade necessária em toda relação saudável – não dá para entender muito bem o que faz Ana tolerar por tanto tempo um relacionamento com um homem visivelmente problemático: dominador, possessivo e controlador, que tenta compensar seus erros com presentes caros e luxuosos. Há também aquele mito de que toda mulher sonha em transformar um bad boy em um homem bom – embora isso não reflita minha opinião sobre o assunto, mas não há dúvidas de que o livro cujo filme foi adaptado é escrito em cima de clichês famigerados como este. Mas, é importantíssimo ressaltar: é óbvio que o filme não quer passar um exemplo de forma de conduta. Tampouco, se leva a sério. Portanto, não que seja uma “muleta” defendê-lo, mas quem assiste sabe exatamente o que vai encontrar: um melodrama brega e sem compromisso com a realidade.

“Cinquenta Tons de Liberdade” também se apoia em temas corriqueiros das relações: temores como compromisso, gravidez, fidelidade, ciúme e etc. Pena que esses temas sejam pobremente explorados e, como mencionei, pouco se apliquem na vida real – os personagens parecem viver em um mundo paralelo, onde as ações/reações quase nunca fazem sentido. Vale reforçar que a obra é uma ficção, uma fantasia para seu público-alvo, geralmente mulheres de certa faixa etária que justamente querem “fugir” da realidade e mergulhar em um conto de fadas. Lembre-se, para encontrar alguma qualidade no filme, você precisa deixar se envolver pelo universo. Senão, será apenas perda de tempo.

 

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Refém da paixão (e da cafonice)

O longa conta com pontos muito mais positivos com relação ao anterior. A direção de James Foley melhora bastante neste capítulo, já nas primeiras cenas demonstrando que finalmente entendeu o conceito de sensualidade que todos os filmes deveriam ter passado desde o início. Aqui ele explora ângulos de câmera e silhuetas dos belos corpos da dupla principal, onde “vazam” algumas partes de maneira mais sutil. Há até uma espécie de “homenagem” à cena da cozinha de “9 1/2 Semanas de Amor”, desta vez com sorvete – um belo merchan para a marca Ben & Jerry’s.

O filme também consegue utilizar algumas pistas visuais para reforçar a mensagem de libertação e transformação na relação do casal, como o cabelo trançado no início que representa como Ana estava dominada e presa a Christian, ou pequenos comandos dela a ele como fazer cabelo e a barba – ok, coisas totalmente triviais, mas que em um universo tão pobre de subtexto acabam se destacando.

O lamentável é que o filme desperdiça várias possibilidades de enriquecer o subtexto e adicionar peso dramático, como o próprio Complexo de Édipo “invertido” de Christian – segundo Freud, o primeiro impulso sexual de uma criança é para com a sua mãe e o primeiro impulso homicida, para com o seu pai. Em vários momentos ao longo da franquia, Christian parece ser uma versão peculiar desse complexo, mas é claro que a escrita rasa da autora da obra E.L. James nem menciona esta condição. Sequer deve ter pensado nisso, para falar a verdade.

Entretanto, se o longa acerta na transformação da relação do casal – mesmo que seja de maneira rasa, cafona e conveniente -, certamente tem vários outros problemas, como narrativa e coerência. Há um vilão criado de maneira forçada desde o filme anterior, e sua trama de sabotagem e chantagem falha miseravelmente pela motivação mal explorada e desenvolvida. Isso resulta em momentos sem sentido, como uma perseguição de carro ou um sequestro relâmpago.

Ele menciona alguns subtemas e os abandona, como o fato de Anastasia ter que lidar com a exposição da mídia, necessitar de segurança pessoal e novo status social que precisa se acostumar. Tudo isso é mencionado a princípio, mas não leva a nada no final das contas. Também fala de traição e não explora, sem falar nas incoerências – em certo momento, Christian fica revoltado porque Jack (antigo chefe de Ana) filmou transas com antigas assistentes, mas e quanto a ele, possivelmente o cara mais pervertido do mundo, que não se dá conta das bizarrices que fazia?

Além disso, há uma grande sequência final no Banco que deveria passar tensão e suspense, mas é muito mal construída e as atuações do elenco continuam não ajudando, tornando o clímax do filme todo atrapalhado. Por outro lado, há uma breve homenagem aos fãs, com momentos marcantes de toda a franquia no final. Considerando tudo isso, uma coisa é fato: seja você fã ou não da série de filmes e livros, não dá para negar que “Cinquenta Tons de Liberdade”, assim como toda a franquia, tem muitos mais erros do que acertos, mas de certa forma entrega aquilo que o público-alvo espera. Sendo assim, é seguro afirmar que este último capítulo encerra toda trajetória dos personagens de maneira eficiente e aceitável no final das contas. Enfim, acabou.

E você, já assistiu ou está ansioso para ver? Concorda ou discorda da análise? Deixe seu comentário ou crítica (educadamente) e até a próxima!

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