Às vezes é preciso pouco para fazer muito. Esta ideia diz respeito tanto a forma como o filme em questão foi produzido, quanto a forma em que seu próprio enredo foi elaborado.
Todos os preparativos estão em andamento para uma bela celebração do quadragésimo quinto aniversário de casamento entre Kate Mercer e seu marido Geoff, um casal maduro e sem filhos. A alegria de Kate não poderia estar maior, bem como não poderia estar ameaçada até que um fato bastante inesperado e incomum acontece. Seu marido Geoff recebe uma carta informando que o corpo de sua antiga namorada, Katya, havia sido encontrado nos alpes suíços, após mais de cinquenta anos do seu desaparecimento.
Tal notícia acaba deixando Geoff transtornado sem saber o que fazer. Afinal, estaria ele com ânimo para comemorar, com grande estilo, suas bodas de platina junto a sua esposa Kate, ou ele deveria viajar para a Suíça para, ver pela última vez, o rosto do seu primeiro grande amor?
Apesar de sentir muito com a referida notícia, Kate estranha o comportamento repentino de seu marido, a ponto de achar que ele tenha despertado uma grande obsessão em torno da sua trágica história com Katya. Kate acaba manifestando uma profunda tristeza e despreparo diante da situação delicada em que seu casamento estava vivendo, até que a mesma decide ir a fundo para ver o que, afinal, teria deixado o seu marido naquela situação tão deprimente. O revelar do passado acaba deixando Kate numa profunda amargura, chegando a se questionar se o amor de Geoff por Katya ainda estaria vivo mesmo depois da morte desta e mesmo depois de mais de cinquenta anos separados. Teria sido Katya capaz de dar algo a Geoff que Kate não poderia ter dado quando o mesmo tentou seguir em frente?
Questionamentos sem solução, perguntas sem respostas, as quais, Kate só consegue esperar de si mesma, uma vez que ela tenta, por muitas vezes, não abalar a estrutura emocional do seu marido, para que isso faça com que ele passe a amá-la menos.
Neste filme britânico, dirigido por Andrew Haigh e com um enredo bastante simples, as atuações de Charllotte Rampling (muito pouco conhecida no Brasil) e de Tom Courtenay (lembrado por filmes como ‘Dr. Jivago’) são dignas de elogio. Não foi nada injusto Charlotte estar entre as indicadas ao Oscar de Melhor Atriz deste ano. É claro que mesmo muito boa atriz, em comparação com as demais concorrentes, dificilmente ganhará o prêmio.
Em relação ao filme, notam-se pontos muito positivos. Embora seja uma produção dramática europeia, o filme não é cansativo, é direto com uma história envolvente. Outro ponto interessante, é fotografia da produção que destacou muito bem as cores de uma cidade meio que interiorana, clareada por um céu cinzento de névoa. Outro destaque é a famosa e romântica música que marcou o casamento dos personagens principais, “Smoke Gets In Your Eyes” de The Platters. Detalhe curioso é que mal se notou a presença de Geraldine James, que participou das duas sequencias da readaptação para as telas, de ‘Sherlock Holmes’ e que, em ‘45 Anos’, faz a melhor amiga do casal protagonista.
Por mais que o público, em geral, não aprecie os enigmas quase que insolucionáveis que muitos cineastas, principalmente os europeus, insistem em manter nas suas produções, há um ponto que conseguiu mistificar e, ao mesmo tempo, engrandecer o enredo, a ponto de gerar uma incógnita para o entendimento do telespectador. Este ponto diz respeito à cena final em que a personagem Kate chora. Neste momento, o público fica a refletir sobre o principal motivo que levou Kate a chorar, se era por estar feliz e despreocupada diante de um problema resolvido ou se era devido ao desespero por estar diante do início de uma vida triste e injusta que a personagem passaria a viver.