DECISÃO DE RISCO (2016) análise - FVFRAGA - Pipoca de Pimenta

O aclamado clássico ‘12 Homens e uma Sentença’, de 1957 (baseado em uma série de TV e refilmado em 1997), discutia as questões éticas e morais, de se condenar um homem por seus crimes em um tribunal e a importância de se analisar as evidências em um contexto em que ele parecia facilmente culpável. Conforme o enredo e diálogos do filme iam transcorrendo, as certezas dos personagens caiam por terra e o “benefício da dúvida” prevalecia. ‘Decisão de Risco’ de 2016, utiliza o contexto “da guerra ao terror”, para debater indagações parecidas, ainda que numa realidade totalmente diferente.

Os conflitos bélicos sempre renderam os mais diversos embates morais, tanto que vários filósofos se debruçaram sobre esses questionamentos, desde pensadores medievais ocidentais como Maquiavel, até orientais como Sun Tzu, entre outros de diferentes épocas. O advento da utilização de “drones” para atacar alvos de guerra trouxe diversas novas questões éticas sobre os comportamentos e regras desses conflitos. O quão “correto” é promover esses ataques não tripulados, em que um ou mais soldados decidem “quem vive e quem morre”, sem um julgamento jurídico e em um país estrangeiro?

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Se esses militares não colocam sua vida em risco, durante a ação, será que seus atos vão ter o mesmo impacto psicológico de um embate corpo a corpo? Até onde é justo, ético e moral essa burocratização e automatização da morte, onde ela parece mais um jogo eletrônico, controlado de uma cabine, por controles remotos. Existe alguma diferença entre os soldados que explodem pessoas inocentes, por engano ou intencionalmente, tentando atingir “terroristas”, para os “homens-bomba” que sacrificam as próprias vidas e de outrem, em nome de religiões ou ideologias. Os fins justificam os meios? Seria certo matar “poucas pessoas inocentes” para salvar “muitas pessoas inocentes”? E se o país em que vivem essas pessoas não possui “pena de morte”, o quão legítimo é passar por cima de suas leis, matando “extremistas” ao invés de prendê-los?

Perguntas como essas não são novidade e se acirraram ainda mais após o atentado ao World Trade Center, em 11 de setembro de 2001. Os Estados Unidos, juntamente com outros países, invadiram nações árabes como o Iraque e o Afeganistão, com o argumento de que eles tinham “armas de destruição em massa”, que nunca foram encontradas. Os críticos alegam que foi por questões econômicas, como a exploração do petróleo, além do instinto de “vingança” travestido de “justiça”. O governo Obama retirou a maior parte das tropas, mas ainda permanece em locais estratégicos, de onde operam naves “não-tripuladas” em diversos ataques. Todos estes acontecimentos, entre outros, culminaram na atual crise internacional, que afeta os refugiados na Síria, contextos como a chamada “Primavera Árabe” e demais nações envolvidas.

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O tema já foi abordado em filmes como ‘Good Kill – Máxima Precisão’ de 2014 (com o ator Ethan Hawke e dirigido por Andrew Niccol), que retratava mais o ponto de vista do impacto que essas ações têm sobre os soldados americanos. O maior mérito de ‘Eye in the Sky’ é incentivar a reflexão e fazer o público se perguntar o que faria nessa situação em diversos momentos. O longa-metragem oferece uma visão mais ampla, que não se limita apenas aos pilotos, mas, também às pessoas que estão nos cargos de comando que decidem sobre os ataques. Tanto a abordagem inglesa, quanto a estadunidense, uma mais relutante em matar e a outra menos escrupulosa. Abordando ainda outras perspectivas, como o impacto que tudo isso tem na chamada “Guerra da Propaganda”.

A personagem que conduz as ações é Katherine Powell (Helen Mirren), que conduz a narrativa de forma muito competente, nos passando a sensação de o quanto ela precisa agir rápido e tomar a decisão correta, mesmo que não concordemos com ela. Os personagens secundários, também acrescentam qualidade por serem interpretados por ótimos atores coadjuvantes, como o piloto Steve Watts (Aaron Paul, em uma performance bem diferente do Jesse Pinkman de ‘Breaking Bad’). Destaque, também, para o General Frank Benson (Alan Rickman, em seu penúltimo trabalho para o cinema) e Jama Farah (Barkhad Abdi, ator somaliano, naturalizado americano, que já chamava atenção em Capitão Phillips).

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A direção de Gavin Hood (‘Ender’s Game: O Jogo do Exterminador’), aliada ao roteiro de Guy Hibbert (‘Rastros de Justiça’) consegue manter a atenção de quem assiste, sem nunca deixar o ritmo cair. As cenas dos diálogos nos bastidores das decisões tomadas pelos militares, são sempre representadas em ambientes frios, corroborados por uma fotografia azulada ou esverdeada. Já as panorâmicas externas, geralmente simulando as câmeras dos drones, são mais amareladas retratando o calor e a aridez do deserto do local onde a história se passa. Todas muito eficazes em transmitir toda a carga do estresse emocional, que elas carregam na vida real.

Entretanto, o enredo escolhe se limitar em determinado momento adotando um recorte restrito a alguns clichês, prejudicando o excelente desenvolvimento inicial. Personagens interpretados por atores como Phoebe Fox e Kim Engelbrecht são subaproveitados e alguns, como o vivido por Iain Glen, protagonizam até alívios cômicos que não estão de acordo com o restante do tom do filme. Mesmo assim, o longa-metragem como um todo, se configura num thriller político de guerra moderna, tenso, cerebral e oportuno, que tem a capacidade de fazer com que o público reflita sobre um assunto extremamente relevante para o atual contexto político internacional.

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