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Sabe aquele dia onde você só quer tirar uma folga para assistir a um Netflix ou até não fazer nada, apenas descansar em casa, mas visitas aparecem, um parente passa por uma crise existencial e nada acaba dando certo para você? É esse o dilema sofrido pelo protagonista da comédia francesa ‘O Que eu Fiz Para Merecer Isso? ’. Inspirado por uma peça bastante popular no seu país, o diretor parisiense Patrice Leconte, vencedor de um Bafta pelo também indicado ao Oscar ‘Caindo no Ridículo’ (1996), é quem escreve e dirige esta adaptação.

Passeando por uma feira de artigos antigos, Michel (Christian Clavier) encontra um disco de jazz raríssimo que procurava há muitos anos. Então ele corre para casa para saborear a bela música no sossego do seu lar. Mas é só colocar a agulha no disco para aparentemente o mundo se voltar contra ele, com um problema atrás do outro o impedindo de aproveitar seu álbum em paz. Sua esposa Nathalie (Carole Bouquet) e a amiga Elsa (Valérie Bonneton) estão com problemas e precisam de Michel, assim como seu filho problemático (Stephane De Groodt), a empregada (Rossy de Palma), isso sem mencionar os vizinhos do prédio de Michel que pretendem dar uma festa no condomínio bem naquele dia.

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Logo no início, com a negociação do seu tão precioso disco, percebemos que Michel não é uma das pessoas mais espertas. Seu personagem atrapalhado parece ser herança de outros ícones da comédia “francesa” no cinema como o inspetor Jacques Clouseau da série ‘A Pantera Cor-de-Rosa’ dos anos 60 – o “francesa” está entre aspas porque apesar de interpretar um francês com maestria Peter Sellers era britânico. A diferença aqui é que Michel não tem quaisquer qualidades que causem um contraponto no seu personagem e indiquem que ele conseguirá sair ileso das confusões em que se meteu, portanto, o espectador no fundo já sabe que a vida do protagonista vai ser virada de cabeça para baixo, já que ele mesmo não consegue se ajudar.

É claro que mencionar o gênio Peter Sellers e etc. é tudo muito bonito, mas no papel. Para uma comédia funcionar bem, uma série de questões precisa ser considerada. A proposta de ‘O Que eu Fiz Para Merecer Isso? ’ é de fazer uma comédia de situação, onde o espectador possa rir ao se identificar com os problemas cotidianos que acontecem, mas há um sério problema no filme onde os personagens a todo momento parecem saber que estão em uma comédia, tornando-os exageradamente teatrais e, por consequência, artificiais.

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Já mencionei em outras análises que uma comédia de situação como esta não precisa necessariamente de personagens complexos, mas pelo fato de muitas vezes o conflito do filme ser algo muito trivial (como neste caso, um personagem querendo apenas ouvir um disco em paz), a forma como estes personagens reagem aos incidentes é extremamente importante para que o espectador sinta uma empatia com aquela reação. Esse é o dom do comediante, o segredo de Monty Python ou das “sitcoms” norte-americanas funcionarem tão bem, coisa que infelizmente neste filme ninguém do elenco alcançou.

Portanto esta farsa (ou seja, comédia propositalmente exagerada), consegue fazer o espectador rir uma ou duas vezes de verdade, mas seu excesso de diálogos e situações deliberadamente feitas para forçar o espectador a rir, não encontra o timing certo a ponto de fazer o espectador criar empatia com aqueles personagens e se divertir com as trapalhadas aumentadas a proporções absurdas ao longo do filme. Isso poderia até funcionar no teatro (na verdade, funciona) ou numa adaptação para um circo, por exemplo, mas em uma narrativa cinematográfica deve haver uma disciplina onde, entre todas as vertentes possíveis, escolher aquelas que justifiquem as ações dos personagens ou impulsionem a história rumo a uma resolução, e não fique apenas pescando uma risada aqui e ali.

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Sendo assim, o título do filme é piada pronta, pois meio que reflete o sentimento de passar quase uma hora e meia diante daquele universo completamente implausível (mesmo que dentro da própria lógica interna do filme). É possível que atinja uma pequena parcela do público médio, especialmente fãs de seriados cotidianos como ‘Sai de Baixo’ ou ‘Minha Mãe é Uma Peça’, mas um pouco mais de carisma dos personagens talvez pudesse tornar a trama mais simpática e acessível a um público maior. Muito por culpa do roteiro e da direção, o elenco é fraco e não consegue salvar a história tornando-a mais divertida. É um filme de orçamento bastante modesto, onde as locações e a direção de arte são bastante simples e não comprometem o saldo final, a trilha sonora é manipuladora para tentar envolver o espectador, mas também não consegue atingir o efeito desejado e a adaptação cinematográfica acaba por se revelar completamente desnecessária, que deveria ter permanecido nos palcos do teatro.

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