Por Trás do Céu

Para se fazer cinema de boa qualidade, basta ter em mãos um bom roteiro, um diretor competente e um elenco que consegue ser crível com seus personagens. É isso que ‘Por Trás do Céu’, novo trabalho do diretor Caio Sóh se compromete a fazer. E cumpre, mas de uma forma muito espirituosa, começando por seu título que soa como um título de um poema. E além de ter boa qualidade, é isso que o filme oferece ao público: uma poesia cinematográfica. Após fazer bonito em seu último trabalho ‘Teus Olhos Meus’, Sóh volta a emocionar o público equilibrando seu drama sutil com uma dosagem de humor que seus protagonistas exprimem.

A pretensão do filme não é ridicularizar os nordestinos, já que a pobreza do Nordeste no Brasil já foi narrada sob diversas formas, como os premiados ‘Abril Despedaçado’ e os recentes ‘A História da Eternidade’ e ‘Boi Neon’. Em ‘Por Trás do Céu’ seus personagens podem ser vistos como pobres miseráveis sem qualquer formação educacional ou instrução, que dão espaço para uma sabedoria e a dura experiência que a vida lhes obrigou a ter como lição. Por se tratar de um filme sertanejo dirigido por um carioca, pode ser incompreendido e lembrado como “aquele filme em que os “sudestinos” vão a região nordestina e contam uma história fantasiosa do jeito que eles acham que o sertão realmente é” ou um filme que faz chacota de um povo sofrido.

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Esta não é a intenção de Caio que fez questão de rodar, em cenários compostos por locações lindíssimas, nos cenários naturais áridos, da cidade de Cabaceiras em João Pessoa, no Lajedo de Pai Mateus. O roteiro pode fugir um pouco da realidade, mas, deve-se admitir que se diferencia dos padrões dos filmes que se encaixam neste gênero. ‘Por Trás do Céu’ é um bonito trabalho realizado com uma refinada fotografia em tons azuis, que proporciona mais que entretenimento por poder ser, apreciável por sua simplicidade e pela sensibilidade de seu enredo.

Inspirado na peça do próprio Caio Sóh, Aparecida (com Nathalia Dill em performance cativante), uma garota sonhadora do sertão que almeja conhecer o mundo. Ela vive uma rotina fastidiosa e sua única companhia é Leproso, sua tartaruga de estimação. Ela é casada com Edivaldo (Emílio Orciollo Neto que também assina a produção), um homem amargurado por causa de um passado que não gosta de lembrar (em flashback o espectador vai conhecendo melhor o passado deles que pareciam ser felizes até acontecer uma tragédia, que foi o motivo para se isolarem do mundo) e que não dá a mínima para os devaneios de Aparecida. O único contato que Aparecida tem com o mundo é através de Micuim, amigo do casal (o pernambucano Renato Góes, ótimo, que com seu inocente humor consegue driblar até os momentos mais tensos ou dramáticos – algo semelhante feito por Mateus Nachtergaele em ‘O Auto da Compadecida’).

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O outro lado cômico, porém, com uma vida não menos trágica, fica também por conta de Valquíria (Paula Burlamaqui, excelente) uma prostituta infeliz com a vida que leva e acaba se juntando ao trio – Aparecida, Edivaldo e Micuim – mesmo não disfarçando sua antipatia por eles, ela acaba se rendendo à ingenuidade deles. São figuras assim que acabam conquistando o público por descrever bem suas formas de comportamento que transcendem muito mais que se espera.

Sóh entrou na onda de levar para as telonas, histórias passadas no agreste (que interliga com seu primeiro longa ‘Minutos Atrás’), mas com personagens, diálogos e seus modos de vida que aparentam estar muito fora da realidade do que estamos acostumados a ver. Filmado com o atores centrais não nordestinos (Nathalia Dill é carioca e Emílio Orciollo Neto é paulistano), ‘Por Trás do Céu’ é uma mistura de sotaques de atores globais que se reúnem para falar o “nordestinês” – embora que em algumas situações, Nathalia perca um pouco o linguajar nordestino. Estes detalhes não são tão importantes se tratando de uma ótima produção que é no mínimo primorosa e atraente. Imperdível.

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