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‘Abra sua mente. Mude sua realidade’.

Stephen Strange (Benedict Cumberbatch) é o melhor neurocirurgião existente. Ciente disso, o doutor tem uma personalidade extremamente arrogante, passando por cima de tudo e de todos sem remorso algum, até mesmo daqueles que gosta, como Christine (Rachel McAdams), uma amiga e colega de trabalho. Certo dia, Stephen sofre um acidente e não pode mais trabalhar como cirurgião. Para tentar ter sua vida de volta, embarca em uma jornada mística para encontrar a Anciã (Tilda Swinton), um ser extremamente poderoso que pode lhe ajudar a curar suas mãos. Mas enquanto isso, Kaecilius (Mads Mikkelsen), um antigo aluno da Anciã, se rebela contra sua mestra e agora quer destruir a Terra. A direção é de Scott Derrickson (de ‘O Exorcismo de Emily Rose’ e ‘A Entidade’), que também contribui com o roteiro do filme.

‘Momento Wikipedia’: Doutor Estranho surgiu pela primeira vez nas HQs em 1963. Seu personagem se destaca dos demais por usar a magia como forma de defesa e ataque, diferentemente da força física que caracteriza a maioria dos outros super-heróis. Com este diferencial, as revistas do Doutor fizeram grande sucesso de vendas, principalmente nas décadas de 70 e 80. ‘Fim do momento Wikipedia’. Este é o décimo quarto filme da Marvel (MCU) e o segundo da terceira fase do estúdio, que iniciou em ‘Capitão América: Guerra Civil’. A contratação de Derrickson para a direção foi uma decisão interessante, considerando que o diretor é especialista em filmes de terror e a Marvel tem como algumas de suas características pouco impacto com a violência e o conhecido senso de humor. Mas a ideia partiu do próprio Derrickson, que é grande fã do personagem e fez um vídeo conceitual do próprio bolso para impressionar o estúdio. E qual será o resultado de tudo isso?

Não dá para negar que há uma fórmula nos filmes da Marvel que tornam suas histórias bastante previsíveis, especialmente para aqueles espectadores mais atentos. Mas fórmulas não são de todo ruins, elas servem para os roteiristas e estúdios como um ‘guia’ para passar de forma clara e objetiva a mensagem que eles querem e são repetidas à exaustão porque a História mostra que elas dão certo, as pessoas reagem bem a histórias familiares a elas de alguma forma. Aqui em ‘Doutor Estranho’, mais uma vez estamos diante de um novo personagem, e por isso se faz necessária sua história de origem. Stephen Strange é um personagem bem interessante. Rico, charmoso, inteligente e extremamente talentoso. Não é a toa que uma pessoa com tantas qualidades desenvolva uma personalidade completamente arrogante e egocêntrica, por se achar muito superior aos outros. Ok, quem assistiu ‘Homem de Ferro’ e conhece Tony Stark sabe que isso não é bem original, mas a forma como cada personagem vai sofrer seu revés e alcançar sua transformação é diferente, o que torna a ‘jornada’ de Stephen até se tornar o Doutor Estranho tão interessante (ou até mais) do que qualquer outro super-herói do universo Marvel (MCU).

Strange é um personagem que perdeu tudo e aprende através do sofrimento. E não foram apenas bens materiais, fica claro na excelente interpretação de Benedict Cumberbatch que o personagem é solitário (dá pra sentir sua intensidade especialmente na cena pós acidente), se sentia autossuficiente, mas na verdade era cercado por bajuladores. Embora o filme não se aprofunde tanto na angústia dramática que claramente Benedict conseguiria dar conta (afinal, é um filme da Marvel), a busca pelo equilíbrio espiritual de Strange serve como uma metáfora para a importância da humildade. Stephen achava que fazia bem para o mundo porque salvava vidas como médico, mas a bem da verdade, o tempo todo só estava pensando no seu sucesso. Filmes de super-heróis são legais, mas quando trazem consigo uma mensagem, um princípio moral embutido, ficam melhores ainda. Mude sua realidade, seja uma pessoa melhor.

Além da jornada pessoal do protagonista, há duas histórias alternativas, uma subtrama de romance entre Strange e Christine e é claro, a ameaça do vilão Kaecilius. Até a metade do filme há um equilíbrio muito bom entre a exposição através dos diálogos e cenas de ação que demonstram o que de fato é a realidade alternativa que envolve a trama. Não por acaso talvez o melhor momento do filme seja o primeiro encontro entre Strange e a Anciã, com uma viagem psicodélica sensacional, que lembra bastante (a seu modo, é claro) Matrix, diga-se de passagem. Com relação ao desenvolvimento do relacionamento entre Strange e Christine, o filme não gasta muito tempo ‘forçando’ esta subtrama, o que é muito positivo, pois não desvia o foco da história principal. Mas quando falamos de vilão, mais uma vez surgem algumas ressalvas. O filme não capricha no desenvolvimento dos personagens secundários. Wong (Benedict Wong) e Mordo (Chiwetel Ejiofor) – que são assistentes da Anciã – têm pouca importância para a trama e especialmente Mordo parece ser um personagem bem inconsistente, meio que não dá para entender (ou acreditar) em tudo o que ele faz. Wong ao menos serve nas principais cenas de alívio cômico, com seu jeitão fechado e reservado.

Já Kaecilius é mais um vilão no qual a motivação é genérica, e isso atrapalha muito porque Mads Mikkelsen está bem no papel. Com uma motivação tão fraca e até uma presença pouco ameaçadora perante os poderosos super-heróis, isso desencadeia uma série de problemas no final do segundo ato. Primeiro, como sua motivação não está totalmente clara ou convincente, gasta-se muito tempo explicando quem é quem e o porquê estão fazendo tal coisa, o que perto do clímax prejudica, pois torna a trama um pouco enfadonha. Segundo, há um excesso de alívio cômico nos confrontos entre os personagens (leia-se lutas). Apesar de cenas esteticamente muito bonitas e coreografadas, passam uma sensação ‘anticlimática’ no espectador, pois toda a tensão do momento é dissipada com uma gag visual ou uma frase engraçadinha (de novo, é um filme da Marvel!). Ah, e há um twist interessantíssimo no final, mas com certeza vai dividir muito a opinião das pessoas entre os que amaram e os que detestaram.

Para concluir, ‘Doutor Estranho’ é a prova consumada de que o universo cinematográfico da Marvel está mais do que pronto para partir para o plano místico das super batalhas. A direção de Derrickson é bem competente, apesar de não se arriscar, ele executa muito bem seu papel visualmente e em termos de arco de protagonista. Utiliza bem algumas metáforas interessantes como a cena da maçã, que remete à tentação do fruto proibido na busca por um poder maior e mais perigoso, além dos famosos services, como a capa vermelha incrível. Benedict Cumberbatch e Tilda Swinton estão perfeitos – inclusive Benedict passou um ano como voluntário em um monastério na Índia e alegou uma grande influência que isso causou na sua vida – e é claro, há Stan Lee e ainda duas cenas pós créditos, uma bem engraçada e a outra mais tensa. Se a fórmula da Marvel está cansando alguns é até compreensível, mas é inegável que para fãs de histórias em quadrinhos, ver todos esses heróis representados no cinema é uma sensação realmente espetacular.

UM MOMENTO APIMENTADO: A primeira viagem de Strange ao mundo psicodélico, visualmente impressionante.




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