‘Nova obra de Wook Park é sexy sem ser vulgar, explícita sem ser gratuita. E engenhosamente chocante’.
PANORAMA GERAL: Uma mulher (Tae-ri Kim) é contratada para servir como criada de uma lady (Min-hee Kim) durante a ocupação japonesa na Coréia do Sul na década de 30. Entretanto, tudo faz parte de um plano para fazer a lady se apaixonar por um conde (Jung-woo Ha), que quer herdar toda sua fortuna. A direção é de Chan-wook Park, se você é fã de cinema asiático certamente já ouviu falar sobre esse diretor incrível, que tem como principais trabalhos o genial ‘Oldboy’ e o restante da ‘trilogia da vingança’. No ocidente, Park dirigiu o mediano ‘Segredos de Sangue’. O filme é baseado no livro ‘Fingersmith’, de Sarah Waters e foi adaptado por Park e sua colaboradora de costume Seo-kyeong Jeong.
UM FILME SOBRE PECADOS: Curioso que o título original sul-coreano significa ‘A Lady’ – se referindo a personagem Hideko (Min-hee) -, mas aqui no ocidente foi trocado por ‘A Criada’, referindo-se a Sook-Hee (Tae-ri). ‘A Criada’ é aquele tipo de filme onde as informações vão sendo soltas aos poucos para aumentar o suspense e o mistério e toca em vários temas interessantes. Pecado, roubo, adultério, mentiras, estelionato, cobiça, inveja, luxuria e como não poderia faltar, vingança. Tudo o que poderíamos esperar de um filme do diretor. E mesmo com 2h24min de duração a narrativa se mantém fluindo sem cansar, graças a incrível habilidade de Park como contador de histórias. ‘A Criada’ é um filme que cresce a cada cena.
POLÊMICO E PERTURBADOR: Confesso que para aproveitar o máximo possível dessa experiência cinematográfica única, ajuda muito não saber quase nada sobre a história, portanto, serei o mais vago e sucinto possível. A história é contada sobre pontos de vista diferentes, como mencionei algumas informações são escondidas do espectador para serem soltas mais à frente e há a questão da diferença de classes que nos faz entender porque os personagens são quem eles são: alguns porque podem e outros porque precisam. Todo mundo quer ter uma vida melhor e alguns farão o que for preciso para chegar lá. Mas, antes de sair acreditando em tudo o que vê, lembre-se que ninguém no mundo está livre de pecados. Isso sem mencionar os temas mais polêmicos e perturbadores – marca registrada de Park. É incrível como o diretor sabe como fazer a tensão sexual entre os personagens crescer natural e gradativamente, por meio de cenas aparentemente corriqueiras, mas que ganham um significado poderoso conforme o filme avança.
Segundo o diretor, a gata introspectiva (de branco) e o cãozinho arisco e amável (de preto)
WOOK PARK SENDO WOOK PARK: A direção de Park também merece destaque pela forma como as imagens ajudam a contar a história do filme. O diretor tem uma excelente noção de espaço e enquadramentos de diversos ângulos, e juntamente com seus diretores de arte e fotografia cria um universo sombrio e até repulsivo – quase uma sociedade secreta -, mas ao mesmo tempo, alterna com momentos realmente apaixonados, filmados com uma delicadeza incrível. Nunca a palavra agridoce descreveu tão bem um filme para mim. Essa é a diferença da mão de um diretor que sabe tornar algo sexy sem ser vulgar e até ser explícito, sem ser gratuito. Lembrando que para as cenas de sexo, o diretor deu folga a toda equipe e restante do elenco, exceto os assistentes das duas atrizes, deixando-as mais à vontade, uma prática que parece simples, mas nem todos usam, deixando cenas que deveriam transmitir veracidade na paixão completamente frias e sem graça.
O esmero com detalhes e as sutilezas fazem a diferença na direção de Wook Park
POESIA AUDIOVISUAL: O elenco também precisou aprender japonês para o filme, fato muitíssimo elogiado pela imprensa japonesa. A atenção aos detalhes é que pode resumir bem o sucesso de ‘A Criada’. A atuação de todo o elenco também está formidável, com suas nuances e características do cinema asiático, é claro. Em entrevista, Park declarou que para a construção das personagens, ajudou pensa-las como um cão (a criada) e um gato (a lady). E, por mais estranho que possa parecer, isso fica bem refletido na personalidade das duas, enquanto Sook-Hee (a criada) é mais viva, amorosa (até ingênua) e está sempre correndo para lá e para cá para servir seus ‘donos’, Lady Hideko tem uma postura muito mais calma, introspectiva e, é claro, adora ser paparicada. Outro destaque vai para a sensacional e muito bem utilizada trilha sonora de Yeong-wook Jo, melancólica, grandiosa, assustadora. Genial composição que parece mesclar desde os violinos gritantes de Herrmann as melodias românticas de Steiner. E o que dizer da bizarra imagem de Katsushika Hokusai ‘The Dream of the Fisherman’s Wife’?
Impactante imagem de Katsushika Hokusai, ‘The Dream of the Fisherman’s Wife’
VEREDITO: ‘A Criada’ é sem exageros mais uma obra-prima do cinema asiático. Um filme tão rico, poético e com uma capacidade incrível de surpreender o espectador. Chan-wook Park entra de vez para a categoria dos grandes cineastas do século XXI, sempre com obras ousadas, provocadoras, repulsivas, mas ao mesmo tempo interessantes. Um filme impossível de se ignorar.
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