SINOPSE

Sempre que estreia um novo suspense nacional ele acaba se destacando em meio a tantas comédias, biografias e documentários produzidos pelo cinema brasileiro. Foi assim com ‘O Lobo Atrás da Porta’, ‘Isolados’ e ‘Confia em Mim’, ambos de 2014. Mesmo que nem todos possam se igualar aos melhores filmes norte-americanos e europeus, ainda assim é um importante passo na produção de “gênero” do nosso cinema. ‘O Vendedor de Passados’ (2015) faz parte desta safra, e mesmo que tenha alguns problemas naturais, por seu orçamento não ser equivalente ao de filmes estrangeiros, merece ser valorizado por sua qualidade técnica e narrativa.

Lázaro Ramos interpreta o protagonista Vicente, que vive de criar passados convincentes para pessoas que pretendem se livrar de algum “trauma” em suas vidas. Geralmente seu trabalho é forjado com base na história real dos clientes, para que se torne coerente e não facilmente desmascarável. Sua rotina muda quando uma nova freguesa, interpretada por Alinne Moraes, aparece solicitando que ele invente antecedentes para ela, do zero, sem que saiba nada de sua biografia verdadeira e com a exigência excêntrica, de que crie um passado onde ela teria cometido um crime.

O VENDEDOR DE PASSADOS 02

O roteiro tem o poder de manter o espectador atento até o fim, mesmo por que possui apenas 1 h e 20 minutos de duração. Mesmo assim, o pouco tempo não diminui a qualidade narrativa, antes disso deixa um “gosto de quero mais”. E se tivesse um maior tempo, poderia ter desenvolvido mais suas qualidades, ou não, mas certo é que tinha potencial para ser mais longo. Duração à parte, trata-se de um longa-metragem que se sustenta pelas boas atuações, edição, trilha sonora, uma trama de mistério envolvente e uma crítica histórico-social apresentada de forma criativa.

Lázaro apresenta uma de suas melhores performances no cinema, apesar de ter que atuar sozinho em muitos momentos, prova disso é que foi vencedor do prêmio de Melhor Ator no Cine PE. Ele convence como um profissional que constrói histórias para seus compradores e inclusive utiliza essa habilidade para conquistar suas namoradas. Seu personagem fica ainda mais interessante, quando descobrimos que ele também desconhece sua vida pregressa, tendo de imaginar um passado para si mesmo.

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O elenco coadjuvante também foi bem escalado. Os pais adotivos de Vicente, bem como o médico amigo da família, interpretado por Odilon Wagner, atribuem uma realidade coesa para a narrativa. Destaque para a atriz Ruth de Souza, que aparece em uma única cena, mas que chama atenção por seu carisma e poderia ter tido uma participação maior. O único fator que desvaloriza seus personagens secundários é a falta de tempo para que eles se desenvolvam mais e gerem identificação com o público.

Aline encarna bem a mulher misteriosa, que envolve o personagem principal por causa de sua beleza e mistério, exercendo um fascínio sobre ele, remetendo aos filmes “Noir” que sempre tinham uma “mulher fatal”. E é na sua representação de personagem, que o filme foge do comum, por não oferecer uma explicação definitiva para quem ela realmente é. A biografia criada para ela, pelo vendedor de passados, é o que serve de referência intertextual com a obra original e as discussões histórico-sociais.

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O filme é livremente baseado no livro do escritor angolano José Eduardo Agualusa. É dirigido por Lula Buarque de Hollanda, que tem no currículo de diretor o longa-metragem Casseta & Planeta – A Taça do Mundo é Nossa (2003) e vários documentários, além de ser um dos fundadores da conspiração filmes, produtora responsável por filmes como ‘Eu, Tu, Eles’ (2000) e ‘O Homem do Futuro’ (2011). A versão literária foi escrita num ambiente onde as pessoas precisavam de um novo passado, para escapar da perseguição de uma ditadura. O longa-metragem é uma releitura, que ambienta a narrativa no contexto brasileiro, utilizando os governos militares do Brasil e da Argentina, de forma inventiva, para referenciar o argumento original.

Muitas pessoas ainda têm alguns preconceitos com produções nacionais, principalmente por causa do excesso de filmes muito parecidos e que por vezes lembram uma extensão das novelas que estreiam todos os anos. Outros têm seus gostos cinematográficos limitados pela superexposição às produções hollywoodianas. Mas se quisermos que nossa produção melhore cada vez mais, precisamos prestigiar a criatividade dos cineastas, que tentam sair desta zona de conforto e nos propiciar filmes de diferentes gêneros, não apenas comédias, biografias e documentários.

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Trailer do filme:

 

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