O livro “A Cabana”, escrito pelo canadense William P. Young foi lançado em 2007 nos EUA, chegando no Brasil no ano seguinte. Desde então a obra se tornou um verdadeiro sucesso ultrapassando 10 milhões de cópias vendidas. O filme “A Cabana” chega aos cinemas dez anos depois (tempo bastante longo para levar uma adaptação às telonas) e pretende narrar ao espectador o encontro de um homem com Deus.
Logo no começo do filme vemos o protagonista, Mackenzie (Sam Worthington), em sua infância nada feliz: sua mãe era constantemente alvo de seu pai alcoólatra. Após presenciar vários momentos de violência em casa ele resolve denunciar o pai na igreja que frequentavam. O resultado disso fora uma grande surra a decisão irremediável de Mackenzie: envenenar o próprio pai. Agora, já adulto, Mackenzie possui a família perfeita, uma esposa dedicada e amorosa e três filhos lindos e carinhosos. O reino está em paz. Até que, em uma viagem com os filhos, a caçula da família, Missy (Amélie Eve), desaparece.
Créditos: Divulgação
Não muito tempo depois descobrimos que Missy fora assassinada em uma cabana por um maníaco que há anos está foragido. A família toda é atingida por este baque, mas Mackenzie em especial mergulha em uma enorme depressão misturada de raiva e culpa.
Alguns dias depois da tragédia, uma carta sem remetente aparece na casa de Mackenzie convidando-o para ir à cabana onde tudo aconteceu e assinado por “Papa”. Este é o apelido que sua esposa e seus filhos usam para chamar Deus. Quando nosso protagonista finalmente retorna para o local do crime ele encontra três espíritos que o guiarão espiritualmente numa jornada cristã para entender o significado das coisas e renovar sua fé.
Sempre há muito pressão envolvida em qualquer adaptação, o espectador muitas vezes não compreende que ser fiel ao livro muitas vezes não é a melhor opção para que um filme seja efetivamente bom. “A Cabana” permanece bastante fiel à obra que o originou, entretanto muitos momentos que fazem do livro uma verdadeira catarse de fé e crenças se perde nas cenas mais essenciais do filme.
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A família Phillips, no começo da trama, é retratada de maneira perfeita, não há qualquer problema à vista, eles são tão bonitinhos que não possuem qualquer realismo. A direção de arte sinaliza isso através das escolhas de azul no filme. Todos os membros da família utilizam azul, e isso fica evidente na cena em que Nan (Radha Mitchell), a esposa de Mackenzie, encontra a família pela primeira vez depois de descobrir que sua filha mais nova está desaparecida. Isso mostra os membros em sintonia, mesmo que esta agora comece a se abalar devido a um acontecimento inédito na vida de todos eles e, portanto, cada um veste um tom de azul diferente.
A utilização do inverno nos momentos mais tristes e verão para os mais felizes e aconchegantes surge como uma escolha óbvia para um filme cheio de clichês. Mackenzie retorna a Cabana para buscar uma forma de sobreviver a tanto sofrimento. Lá, ele encontra Deus (Octavia Spencer), Jesus Cristo (Avraham Aviv Alush) e o Espírito Santo (Sumire). Destaque para a opção interessante de utilizar diferentes etnias para retratar a Santa Trindade. Uma mulher negra é bem diferente do Deus pintado e repintado através dos séculos como um homem branco.
Mas infelizmente o filme não consegue sair do esperado e decepciona em sua demonstração de “fé”. Se você assistiu “Silêncio”, dirigido por Martin Scorsese, entendeu muito mais sobre fé, crença e mudança, do que se assistir mil vezes “A Cabana”. O longa passa arrastado, os momentos vividos por Mackenzie são demonstrados como se a religião cristã fosse a Disney visualmente e o protagonista não possui o livre arbítrio que deveria ter. Pouca reflexão e uma boa dose de diálogos bem escritos e prontos, que não geram provocação ou maturação do pensamento do espectador.
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A direção de Stuart Hazeldine parece optar primeiro de tudo por segurança, nada de planos fora da fórmula já esperada. A trilha orquestra os momentos mais melancólicos e “profundos” para tocar o espectador.
“A Cabana” é mais um daqueles filmes que procuram tratar de desenvolvimento através da fé e religião, porém somente na superfície, como o plano final (Mackenzie toca com a ponta do pé a água do lago) evidencia.