Poucos filmes fizeram tanto barulho antes de sua estreia em tempos como os nossos, onde a confiabilidade do sigilo das grandes produtoras se vê arriscado por hackers. A gigante Sony viu suas produções ambiciosas deste ano e as de 2015 disponibilizadas na rede. Alguns deles como ‘Fury’ (Corações de Ferro), o visceral filme de guerra de David Ayer, ou o polêmico, arriscado e genial ‘A Entrevista’ (2014), geraram embates praticamente políticos entre Estados Unidos e Coréia do Norte, onde fontes alegariam ter detectado o cerne do vazamento, sem provas até agora. A Sony chegou a cancelar a estreia oficial do filme, tentando outras estratégias de exibição, já que o próprio Kim Jong-un se incomodou declaradamente com a comédia. O filme dirigido a quatro mãos por Seth Rogen e Evan Goldberg é a mais brilhante sátira que fecha o ano talvez dando um raio de esperança a geração Superbad.
Para os que ainda não conhecem a história, Dave Skylark (James Franco), um espalhafatoso e afetado entrevistador de celebridades tem a ideia de abordar o onipresente ditador norte-coreano para um bate-bola, por saber que ele é fã de seu programa. Entre inúmeras piadas auto-referenciais de cantores como Eminem, ou o ator Rob Lowe , Senhor dos Anéis, Katy Perry e trocadilhos infames com órgãos genitais e objetos fálicos, este se mostra o filme mais criativo da quinta parceria Franco/Rogen, que juntos protagonizaram bons e irregulares filmes juntos. Oque torna tudo mais icônico no roteiro, é justamente sua crítica a liberdade de imprensa, ou informação, tornando assim a ironia da história meta-linguística. Antes de embarcarem para a entrevista, Skylark e seu produtor vivido por Rogen, são abordados pela CIA com um plano de assassinar o ditador. É neste momento que nos diálogos se questiona a brutalidade do poder norte-americano para resolver suas questões de forma simplista e bélica, ao invés de diplomática e social.
Mesmo não deixando de ser violento, sangrento e estéricamente apelativo, acima de tudo, este é humor de alto nível, diferentemente do que muitos alegam, pois humor deve ser anárquico por princípio. Com um roteiro afiadíssimo escrito por Dan Sterling, existem pelo menos seis cenas emblemáticas, onde a mais notável é a de James Franco(Skylark) e o incrível Randall Park(Kim Jong-un) em um tanque russo ao som de ‘Firework’ de Katy Perry. Oque impressiona talvez para quem trabalha com arte, ou a mídia impressa de uma forma geral, é a seriedade de reações tão acirradas ao que deve ser visto somente como brincadeira, como se em outras épocas muito mais conturbadas não houvessem artistas ácidos como Monty Python, ou a própria tradição do humor stand-up americano para beliscar o traseiro da hipocrisia social e política. Uma pena a consciência social e a cultura do politicamente correto ter anestesiado o senso de humor da maioria. Esperemos que pelo menos a platéia que goste de boas comédias ria de verdade com esta, que a meu ver não é só muito boa, e sim brilhante.
Trailer do filme:
https://www.youtube.com/watch?v=QeFtkFpfP-Q