“Não Olhe” abraça o terror psicanalista e faz um estudo apreensivo sobre o desejo humano

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O período de 17 para 18 anos passa por muitas transformações. Sejam elas psicológicas ou físicas, estão diretamente ligadas na fase adolescente perto da adulta. Há uma observação própria sobre suas necessidades e sobre se o eu é tudo aquilo que poderia ser. A pressão do social, as exigências em casa, tudo faz entrar em conflito com o período conturbado que é o amadurecimento. Apesar destas transformações serem diferentes em cada pessoa, o roteiro de Assaf Bernstein se aproveita do conceito psicanalítico geral desse período ao trabalhar com uma fábula sobre repressão e a quebra dela.

Diante um cenário no qual seus pais estão diretamente ligados a perfeição – sua mãe uma ex rainha da beleza e seu pai um cirurgião plástico – e sua melhor amiga já madura sexualmente e namorando, além da superioridade de outras pessoas da escola, Maria (India Eisley) se encontra encurralada diante um cenário hostil e muito presa ao seu eu. Aproveitando desse cenário tão próximo da realidade apresentado por Bernstein, o roteiro inclui o elemento sobrenatural para dar abertura da sua linguagem cinematográfica.

Mesmo sendo vendido como uma obra de terror, Não Olhe está muito mais próximo de um drama pessoal sobre a vontade de ser outrem.

E isso se torna explícito com o uso de uma outra versão dentro do espelho. Afinal, espelhemo-nos diante daquilo que queremos ser. Na obra, Bernstein utiliza isso através da reprimida garota que deseja ser mais valente e mais sensual para se encontrar diante o grupo social que foi inserida, para ser aceita em casa pelos garotos na escola. A busca por isso envolve o fenômeno sobrenatural proposto pela história e a transformação conversa perfeitamente com o próprio ser humano, até pelo cinema ser um grande espelho da nossa realidade. Obras já exploraram a questão da perfeição e comprovam sobre sua inexistência.

Mesmo que escolhamos uma realidade perfeita, sempre há algo faltando. Efeito Borboleta (2004) consegue tratar isso bem, que mesmo que façamos uma escolha certa em um ponto, um outro dará errado. A representação do espelho explora isso de maneira crua sobre personalidade e mudança. A personagem de India, no início, buscava uma outra versão dela que estava presa em seu interior. Diante disso, a troca de personalidade garante a mudança escolhida por ela, porém com determinadas perdas.

Enquanto a versão inicial era meiga, agora é mais dura, enquanto a de antes era mais contraída, agora é mais solta. Bernstein trabalha isso de forma cinematograficamente madura, principalmente ao abraçar a característica de “filme B”, muito presente diante suas claras referências de Carrie, a Estranha (1976). O cineasta israelense não sente vergonha ao adotar diálogos expositivos e abraçar situações conflitantes em tela, com uma violência brutal e fria, além de uma utilização do sexual de forma tão brutal e fria quanto.

Nisso, temos uma corajosa narrativa, por fugir daquilo esperado do público diante uma obra adolescente, principalmente pelas discussões propostas nas camadas da obra, envolvendo abuso, por exemplo. Bernstein também foge do convencional com seu final apreensivo e duvidoso, deixando aquela questão para o espectador refletir sobre a linguagem que ele quiser, podendo ser sobrenatural, psicanalítica ou biológica. E mesmo com essas três visões, o cineasta discute sobre nosso próprio ser e sobre nossa repressão ou até sobre duas versões de um mesmo alguém.

A direção também é muito feliz com o elenco em mãos. Apesar de ainda amadora, India segura bem sua personagem, conseguindo transformações de reações rápidas, mesmo elas sendo simples. Jason Isaac e Mira Sorvino são os dois mais claramente maduros em tela, com uma interpretação mais profissional diante os adolescentes. No entanto, os dois são os menos exigidos durante a narrativa, o que desanima ainda mais o espectador não acostumado com uma narrativa fora do comum sobre o tema, diferente do que acontece com o “semelhante” Espelhos do Medo (2008), por exemplo.

Apesar de não chamar a atenção diante as outras estreias, Não Olhe explora uma temática poderosa sob uma narrativa adulta e longe do conveniente. As camadas envolta de uma narrativa aparentemente simples, ganham a atenção daqueles que embarcam na jornada de descobrimento e transformação adolescente e fazem da obra algo a mais do que aparenta ser, causando no espectador uma necessidade de reflexão sobre ele mesmo.  

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