A Orfã, dirigido por Jaume Collet-Serra, foi lançado em 2009 e embora não tenha sido um grande sucesso de crítica, fez sucesso com o público geral e alcançou status de cult do gênero do terror. Hoje em dia é difícil encontrar algum fã do gênero (ou qualquer pessoa, na verdade) que não tenha assistido A Órfã, e mais difícil ainda encontrar alguém que não saiba do grande plot twist da história: Esther (Isabelle Fuhrman), a menina órfã de comportamento duvidável, não é realmente uma criança como aparenta ser, e sim uma mulher adulta na casa dos 30 com uma doença que funciona como um nanismo proporcional que a mantém com a aparência de uma criança. Essa reviravolta na trama é o ponto alto da história de Esther e o clímax central do filme.
Agora, 13 anos depois de sermos apresentados à pseudo-órfã pela primeira vez, temos Órfã 2: A Origem, uma prequela que se passa 2 anos antes dos acontecimentos do filme original. O roteiro é assinado por outras pessoas (David Coggeshall, David Leslie Johnson-McGoldrick e Alex Mace dessa vez) e a direção também, ficando a cargo de William Brent Bell (O Boneco do Mal), mas a atriz principal permanece a mesma, Isabelle Fuhrman, que na época do primeiro filme tinha em torno de 10 anos de idade, agora é uma mulher de 25 anos, mas ainda interpretando uma mulher de 30 se passando por uma criança de 10. Para fazer a essa mágica acontecer, Bell optou por deixar o CGI e efeitos visuais de lado e trabalhar com ângulos e truques para disfarçar que Isabelle Fuhrman, como qualquer pessoa sem um problema de tireoide ou coisa do tipo, cresceu e envelheceu nos últimos 13 anos, todos os atores usaram sapatos com altas plataformas para que ela parecesse bem mais baixa que todos e uma criança foi usada como dublê de corpo quase todas as vezes que a menina aparecia de costas. A caracterização de Isabelle como Esther continuou idêntica, tanto o cabelo quanto as roupas e acessórios. Ainda assim, fica bem claro que a atriz já não é mais uma criança, o que por vezes nos distrai da história, mas em geral acaba funcionando mesmo assim.
O filme já começa com Leena (esse é o nome real de Esther) numa instituição psiquiátrica na Rússia, onde ela é mantida em segurança máxima por ser a paciente mais perigosa do local. É uma referência clara ao que tínhamos aprendido no primeiro filme e toda a primeira sequência serve para nos situar na história para aqueles que já não se lembravam muito bem do que havia acontecido, além de ser uma cena com muito sangue e violência, para satisfazer os fãs do horror. Depois de se livrar da instituição, Leena traça um plano para poder fugir do país e começar uma nova vida, com a ajuda da internet ela decide tentar a sorte se passando por uma menina desaparecida há quatro anos nos EUA. Seu plano dá certo e logo ela se vê no centro da família Albright.
Os Albright, Allen (Rossif Sutherland) e Tricia (Julia Stiles) são riquíssimos, no nível de voar de jatinho particular, e vivem numa mansão com seu filho mais velho Gunnar (Matthew Finlan). Desde que sua filha Esther desapareceu, quatro anos atrás, a família opera no automático, com as relações estremecidas, então eles estão mais que dispostos a aceitar quando recebem a notícia de que sua filha perdida foi encontrada. Alguns estão mais dispostos que outros, o filho, por exemplo, olha com desconfiança para a irmã desde o começo e a mãe parece determinada a fazer vista grossa quando essa nova Esther demonstra comportamentos e personalidades bem diferentes de 4 anos atrás, inclusive um sotaque russo que simplesmente não existia antes. Em alguns momentos, essas bizarrices ficam difíceis de engolir, mas pode ficar calmo, o filme tem uma explicação tudo isso.
É difícil pensar como o filme pode dar certo considerando que o grande tema central do primeiro era o mistério que cercava Esther e que agora nós já sabemos até o último detalhe, mas para manter as coisas interessantes, novos mistérios são apresentados. Um deles, em especial, que tenta ter a mesma força da reviravolta do filme original. Não consegue, mas a tentativa é válida (ainda que um tanto quanto forçada) e garante um filme divertido no final das contas.
Mesmo com a diferença de idade entre o primeiro e o segundo filme, Isabelle Fuhrman prova que ainda era a decisão acertada (e única possível) para o papel, dominando o equilíbrio entre criança dócil e inocente, mas sempre um tom malicioso no fundo. Como já sabemos do passado sombrio e do segredo de Esther, o sorrisinho irônico da personagem serve como um lembrete de uma piada interna que ela compartilha com a gente. No entanto, para que Esther possa continuar uma boa protagonista, é necessário que ela tenha um antagonista à sua altura. Enquanto no original a família de Esther era absolutamente ingênua e passiva, aqui a família liderada por Tricia apresenta um desafio à Esther e Julia Stiles é perfeita para o papel, ficando à altura de Esther quase sempre.
Muita coisa poderia ter dado errado numa prequela como essa, mas contra todas as expectativas, ela chega muito mais perto de dar certo. Não é um filme perfeito, e até aí o primeiro também não era, mas diverte com suas absurdidades e personagens deliciosamente controversos.