Tia Virgínia
Director
Fabio Meira
Genre
Drama
Cast
Vera Holtz, Louise Cardoso, Antonio Pitanga
Writer
Fabio Meira
Company
Elo Studios
Runtime
98 minutos
Release date
09 de novembro de 2023
Tia Virgínia, filme nacional escrito e dirigido por Fabio Meira, está no circuito nacional de cinema depois de uma participação premiada no Festival de Gramado (5 kikitos e uma menção honrosa). Estrelado por Vera Holtz, o filme inteiro se passa durante a véspera de Natal de uma família brasileira de classe média bastante tradicional que se reúne para passar a data comemorativa, apesar de suas divergências. Além da família, está presente também a empregada doméstica, que continua trabalhando apesar de estar grávida de 8 meses.
Quem mora na casa que serve de cenário para essa história é Virgínia (Vera Holtz) e sua mãe (Vera Valdez). É a casa em que, no passado, morou toda a família, mas foi ficando vazia com o tempo e só piorou com a morte do pai e doença da mãe que a deixou inválida e precisando de cuidados constantes. O casal teve três filhas, Virgínia, Vanda (Arlete Salles) e Valquíria (Louise Cardoso), mas enquanto Vanda e Valquíria casaram e tiveram filhos, Virgínia permaneceu solteira durante toda sua vida e acabou caindo sobre ela a responsabilidade de parar sua própria vida para cuidar da mãe. Fica evidente no decorrer da história como as irmãs realmente acreditam que a individualidade de Virgínia é menos importante por ser uma mulher, aos seus olhos, “sozinha”.
O poder de “Tia Virgínia” está na sutileza com a qual os temas são abordados e as críticas são feitas. À primeira vista, a família parece ter poucos – ou nenhum – conflitos, com apenas alguns sinais de que as coisas não estavam tão bem assim, mas aos poucos vamos notando sinais cada vez maiores, até que problemas muito mais profundos, traumas do passado e desvios de caráter são revelados enquanto conhecemos a história da família e a personalidade de seus integrantes além da superfície. A situação de Virgínia é muito comum no nosso país, mas raramente retratada em telas, a imagem de “tia” como alguém sem apegos, mas que acaba sendo tratada com desdém pela própria família, sobretudo pelas irmãs. Conhecemos uma sobrinha (Daniela Fontan) e um sobrinho (Iuri Saraiva) e Virgínia não mede esforços para agradar os dois, ainda que em detrimento de seu próprio conforto e, enquanto a sobrinha demonstra um carinho com a tia, o sobrinho é mais traiçoeiro e demonstra um comportamento típico do jovem machista que acredita ser superior aos outros, principalmente por ser um estudante de medicina.
A tensão crescente se traduz no comportamento de Virgínia através de uma performance fenomenal de Vera Holtz, seu maneirismo, suas expressões e seu gradual “descontrole” emocional que acontece ao mesmo tempo em que sua consciência sobre a situação aumenta a ponto de ficar insuportável seguir em frente. A relação estremecida com as irmãs é evidenciada em pequenas fagulhas que se acumulam cena após cena num ritmo comum às famílias brasileiras que, sob a máxima de se colocar a família acima de tudo, estão dispostas a ignorar problemas apenas para manter a imagem de uma família unida – nem que seja ao menos nas datas comemorativas. A situação com a empregada doméstica é igualmente reconhecível, passando por diversas nuances.
É impressionante a gama de assuntos delicados, e essencialmente intrincados à cultura brasileira, que “Tia Virgínia” consegue abordar em suas 2 horas de duração. Os membros da família de Virgínia encapsulam tantas figuras conhecidas, sejam das nossas próprias famílias ou de conhecidos. A irmã esnobe por ter uma condição financeira ligeiramente melhor, o distrato com a empregada doméstica, a idolatração de entes que já se foram, as discussões financeiras, a escolha de ignorar desavenças ao invés de conversar e resolvê-las, as limitações que vêm com o avançar da idade, entre tantas outras. E mesmo com essa diversidade de assuntos, a narrativa mantém seu foco na personagem de Virgínia sem distrações, resultado do roteiro e direção bem resolvidos de Fabio Meira para criar uma história sutil, mas grandiosa, utilizando de elementos de diversos gêneros. É uma obra que reforça o poder do cinema nacional e sua pluralidade, provando seu valor por si só, sem precisar se escorar em artimanhas hollywoodianas.
Por Júlia Rezende