Todos Nós Desconhecidos
Director
Andrew Haigh
Cast
Andrew Scott, Paul Mescal, Claire Foy
Writer
Andrew Haigh
Company
Searchlight Pictures
Runtime
105 minutos
Release date
07 de março de 2023
Em temporada de premiações, muito se fala dos “esnobados do Oscar”. Esse ano, o título ficou com Margot Robbie, que não entrou na categoria de Melhor Atriz e Greta Gerwig, que não foi indicada à Melhor Direção, apesar de ter feito o filme de maior bilheteria do ano, mas depois de assistir a “Todos Nós Desconhecidos”, é difícil de entender como a Academia pode esnobar essa obra em todas as categorias, tanto que o filme garantiu diversas indicações no BAFTA, considerado o Oscar do Reino Unido e ganhou as principais categorias do Dorian Awards, premiação dedicada a obras com temática LGBTQIA+, indicações e prêmios mais do que merecidos. “Todos Nós Desconhecidos” poderia ser considerado um filme nichado, mas a verdade é que, em seu âmago, a história e sentimentos são universais.
Em “Todos Nós Desconhecidos”, a solidão é o personagem principal, presente em todos os personagens, mas personificada em Adam (Andrew Scott), um escritor que se mudou para um prédio novo e com poucos moradores no centro de Londres. Uma noite, um vizinho de Adam, Harry (Paul Mescal), bate em sua porta visivelmente abalado e à procura de companhia. Primeiro ele flerta com Adam, depois, diante da rejeição, diz que só não queria ficar sozinho, com o silêncio do prédio quase vazio, mas Adam é irredutível e, naquela noite, cada um segue seu caminho. Em sua solidão, Adam, que está tentando escrever sobre os pais, toma a decisão de visitá-los em sua casa de infância, mas o que ele encontra muda o rumo de sua história.
Caso você ainda não tenha assistido ao trailer, recomendo que pare de ler a crítica por aqui, há reviravoltas e revelações no filme que podem ser melhor aproveitadas se o espectador não tiver grandes informações sobre a trama. Se você já assistiu ao trailer, você sabe que os pais de Adam (Jamie Bell e uma brilhante Claire Foy) faleceram quando ele ainda era criança. Adam tem consciência de que eles já se foram, mas ao voltar para sua casa de infância, faz também uma viagem ao seu passado e às possibilidades de relacionamento que não teve com eles enquanto estava crescendo. Agora com praticamente a mesma idade que seus pais tinham quando faleceram, ele tenta suprir os anos sem comunicação e aproveitar a situação para deixar que seus pais o conheçam, abrindo um diálogo honesto pela primeira vez. A relação de Adam com os pais traz uma bagagem emocional única e toca em pontos que poucas vezes são explorados com tamanha honestidade, expondo as dificuldades da relação não só desses personagens, mas de pais e filhos no geral.
O desenvolvimento do relacionamento com seus pais abre Adam à possibilidade de uma aproximação com Harry. Um dos pontos mais fortes de “Todos Nós Desconhecidos”, adaptado e dirigido por Andrew Haigh, são os diálogos, que definem a narrativa. As trocas entre Adam e Harry tratam de temas sensíveis e universais, mas que falam mais diretamente com as gerações mais novas e a comunidade LGBTQIA+. Ambos Harry e Adam se identificam como homens gays e apesar de reconhecer em suas experiências uma diferença em relação ao modo como são integrados na sociedade (mesmo que a idade deles não seja tão distante), ainda têm problemas em comum, o principal deles sendo o sentimento de isolamento e solidão, que parece ser inerente aos dois. Não por acaso, é também um no outro que eles encontram uma companhia que transcende amarras, traumas e até mesmo os conceitos de tempo e espaço.
“Todos de Nós Desconhecidos”, no entanto, é mais do que uma história de amor, e o terceiro ato deixa claro o aspecto lúdico que já estava presente desde o começo em tons mais sutis. Romance encontra fantasia que encontra temas sobrenaturais e fantasmas, tudo para contar uma história que mantém seu pé no chão sempre que isso realmente importa. Centrado apenas nos 4 personagens mencionados, o filme explora profundamente a psique de Adam em diversos níveis e com palavras sempre muito bem empregadas. Contida dentro da narrativa de Adam (literalmente, já que ele é um escritor) e acompanhada de uma trilha sonora poderosa, a história é contada de forma envolvente do começo ao fim. A química entre Paul Mescal e Andrew Scott é indiscutível, e o carisma dos dois foi essencial para o magnetismo das cenas entre o casal, muitas delas sexuais, mas sem nunca deixar de lado a cumplicidade e delicadeza compartilhada por eles.
Por Júlia Rezende