Gravado em grande parte no Morro do Vidigal, no Rio de Janeiro, e com um belo visual visto do alto, o filme ‘A Frente Fria que a Chuva Traz’ marca o retorno do mineiro Neville D’Almeida na direção. Afastado dos sets de filmagens desde 1997, quando lançou o tão famoso ‘Navalha na Carne’, o diretor retorna ousando ao gravar uma história sobre jovens inconsequentes e irresponsáveis. O longa, que estreia nessa quinta-feira (28), foi exibido durante o Festival do Rio, realizado em outubro do ano passado, e promete chocar aos mais tradicionais.
A história gira em torno de um grupo de jovens ricos, liderado por Alison (Johnny Massaro), que aluga com frequência uma laje na favela carioca do Vidigal, onde costuma organizar festas regadas a “sexo, drogas e funk”. O espaço pertence a Gru (Flávio Bauraqui), um morador da favela que vive rondando os locatários, ora reclamando dos abusos cometidos, ora tentando participar de cada momento. Enquanto as festas não acontecem, durante o dia, eles permanecem no local aproveitando a bela vista para se bronzear e continuar usando drogas.
O longa é baseado numa peça de Mário Bortolotto – que faz parte do elenco -, e tem algo a dizer sobre o estado do mundo e da nossa juventude. É chocante ver um filme que aborde tanto a estupidez, a insensibilidade e a desonestidade. É importante destacar que todos os personagens são assim, pois são exemplos de pessoas que vemos nas ruas a todo o momento. Destaca-se, então, o distanciamento dos dois mundos quando há a “cafetinização” das favelas pelos ricos, desde festinhas a passeios com gringos, os chamados ‘favelas tour’.
A situação gera total desconstrução da realidade, pois é inimaginável pensar em “patricinhas” e “mauricinhos”, frequentando tranquilamente o local, subindo a favela com seus carros conversíveis, sem os pais terem conhecimento. Não que seja uma forma de preconceito, mas, na sociedade atual, na qual sabemos que há segregacionismo em todas as áreas, seja nas classes sociais, seja nas etnias, nas orientações sexuais, dentre outros elementos, torna-se estranho conceber essa ideia.
O filme também possui diálogos rasos, sem coerência, com o constante uso de palavras chulas. Além disso, só engrena a partir do segundo ato, quando, de fato, a trama se desenrola. Desta forma, os diálogos tornam-se menos fúteis e a construção das cenas passa a despertar mais a curiosidade do espectador. Já o terceiro ato, torna-se “agressivo” ao mostrar as consequências das escolhas feitas pelos jovens que preferem se arriscar em prol de uma aventura.
Bruna Linzmeyer interpreta Amsterdã, uma jovem pobre que se infiltra nas festas dos ricos para conseguir drogas, mesmo que para tanto precise fazer favores sexuais como pagamento. A personagem de Bruna é o “trunfo” do longa. É justamente ela quem transmite a emoção necessária para convencer o público com sua interpretação leve, solta e nada forçada. Apenas com o olhar, ela transmite todo o sofrimento de sua Amsterdã.
Já Chay Sued, que saiu das novelas direto para o cinema, investe em um personagem tão fútil quanto os dos outros atores, mas, seu diferencial é que seu Espeto é o responsável por abastecer o grupo com as drogas mais finas e requintadas. Chay é apático, não transmite o seu potencial com essa atuação. Johnny Massaro, Michael Melamed, Juliana Lohmann também são uns dos responsáveis por equilibrar a trama, mas ainda assim, deixam a desejar.
Apesar de tudo, o filme desperta grande reflexão sobre o futuro dos nossos jovens, a relação entre os moradores da comunidade e a classe rica, a falta de inclusão social, além de fazer o espectador perceber a exploração da classe alta com os menos favorecidos, por meio de serviços, ostentação, dentre outras coisas. Vale conferir!