Tecnicamente, existe uma similaridade entre os documentários e as cinebiografias de personalidades históricas. Este aspecto incomum diz respeito aos acontecimentos mais importantes na vida daquela personagem, desde a sua infância até os momentos finais de sua vida, isso, é claro, quando se trata de um biografado já falecido.
O filme “Irmã Dulce”, diferente do que muitos consideram, não é uma cinebiografia, muito menos um documentário, mas sim um filme baseado na principal fase da vida da religiosa, a qual diz respeito ao seu trabalho social em prol dos pobres de Salvador, na Bahia, desconsiderando boa parte da sua infância, a não ser o curto período em que passou ao lado de sua mãe, bem antes do falecimento desta. Sem falar que a relação de Irmã Dulce com a sua família, seu pai e sua irmã, é muito simplificada, deixando o telespectador curioso em saber o que de fato acontecera com aqueles até o fim da trajetória da freira.
A produção se limita em mostrar, em seu aspecto quase que mínimo, a dura realidade enfrentada por Irmã Dulce em relação as pessoas mais necessitadas que a procuravam e sua relação conturbada com a igreja e o impacto que isso gerou na visita do Papa João Paulo II na Salvador em 1981, onde ocorreu um grande alvoroço e comoção da população, a qual defendia a ida de Irmã Dulce à missa celebrada pelo Papa, o que contrariava às determinações impostas pela Igreja, a qual não permitira que a religiosa se juntasse aos demais convidados. Um momento bastante comovente do filme.
Pode-se dizer que o filme conseguiu ter uma boa receptividade do público. Contudo, como já foi dito antes, a produção nada mais mostra do que uma fase da vida de Irmã Dulce. De um modo crítico, é justo afirmar que 90 minutos de filme é muito pouco para se mostrar com bastante intensidade a batalha da religiosa que, para quem conhece bem a sua história, sabe que a luta de Irmã Dulce em razão dos pobres de Salvador e na construção do Hospital Santo Antônio, hoje um dos maiores do Brasil, foi muito mais do que um ato de amor, muito mais do que uma batalha política e, ainda por cima, a luta da freira estava relacionada a estar diante das maiores enfermidades e doenças infecciosas das pessoas que eram cuidadas por ela. Um gesto bastante generoso e bonito de se ver, algo que deveria ter sido mais bem explorado, mas, contudo, atendendo a um padrão instituído por muitos diretores brasileiros como o diretor deste filme, Vicente Amorim, o desejo e atender à expectativa do público que, tradicionalmente, detesta filmes longos demais. Um verdadeiro tiro no pé já que, ao tentar agradar ao público e desagradar à crítica, o diretor pode ocasionar na desvalorização do filme em muitos festivais de cinema mundo a fora.
Falando do elenco, o filme é estrelado por Regina Braga, Bianca Comparato e Glória Pires, sendo a primeira mineira e as demais cariocas, ainda assim com um convincente sotaque nordestino e que, de fato, conseguem desempenhar o papel de Irmã Dulce na fase jovem e na fase idosa. Gloria Pires tem sim um destaque importante como a mãe de Irmã Dulce, mas, entretanto, ela lembra muito outro personagem interpretado pela mesma no filme “Lula, o Filho do Brasil”, onde Gloria faz a mãe do presidente Lula.
Irmã Dulce não se tornou um filme ruim, mas também não é nenhuma produção espetacular. O tom comovente é algo que ficará marcado na memória do público. Contudo, espera-se que, no futuro, outra produção um tanto mais séria e completa possa ser realizada para melhor contar a trajetória emocionante da religiosa.
Trailer do Filme: