Love Lies Bleeding
Diretor
Rose Glass
Elenco
Kristen Stewart, Katy O'Brian, Anna Baryshnikov
Roteirista
Rose Glass e Weronika Tofilska
Estúdio
A24
Duração
104 minutos
Data de lançamento
02 de maio de 2024
“Love Lies Bleeding”, o segundo filme da cineasta Rose Glass (que também assina o roteiro com Weronika Tofilska), é um filme dificilmente teria sido feito algumas (ou até mesmo uma) década atrás – e a gente, e o cinema como um todo, teria perdido um clássico em potencial. Há muitas camadas em “Love Lies Bleeding” antes mesmo do filme começar, desde sua temática, até seu elenco e equipe criativa, esse não é um filme que segue o tradicional, mas faz suas próprias regras e cria sua ambientação particular com maestria. Violência, crimes, romance, sensualidade e muitos músculos, tudo isso numa narrativa dominada por mulheres e praticamente à prova de reacionários que reclamam do fantasma da “lacração”. Rose Glass criou uma produção que existe e convence por si só, e muito disso se deve também à (mais uma vez) atuação impecável de Kristen Stewart e à presença de cena (e de músculos) de Katy O’Brian.
Numa terra cercada por deserto está uma cidade tipicamente americana no final dos anos 80. Os carros são coloridos, os cortes de cabelo questionáveis, clubes de tiro são o point da vida social e as academias estão em alta. E a história não poderia começar em outro lugar senão uma academia. Lou (Kristen Stewart) é uma funcionária faz-tudo na academia local, está longe de gostar de seu trabalho, mas também não reclama, com uma resignação característica de cidade pequena, mas quando Jackie (Katy O’Brian) aparece para malhar, é amor à primeira vista e suas vidas sofrem uma reviravolta inimaginável. Jackie é aspirante à fisiculturista e está apenas de passagem pela cidade; seu verdadeiro destino é Las Vegas, onde ela participará de um concurso. As coisas acontecem rápido e, sem enrolação, o enredo já estabelece relações e situações que serão importantes mais para frente. Já no primeiro encontro Lou não esconde seu interesse por Jackie e lhe dá acesso a esteróides (até o momento, todos os músculos de Jackie eram naturais). O romance começa ali mesmo e logo as duas estão morando, temporariamente, juntas.
A carga sexual e a química entre Jackie e Lou é a primeira – e a maior – força do filme. A fascinação que Lou tem por Jackie e a forma como elas se tornam rapidamente um casal com intimidade e cumplicidade determina todo seu destino. As cenas das relações sexuais entre as duas são filmadas com proximidade sem serem invasivas, sempre ressaltando o físico, essencial para a história. Kristen Stewart já comprou ao longo de sua carreira que é uma atriz completa, e aqui ela demonstra um lado que ainda não tinha aparecido em seus papéis anteriores, talvez mais próximo de Kristen como pessoa, mas acompanhado de uma sutileza muito contrastante e complementar em relação à atuação e à personagem de Katy O’Brian – e até mesmo ao filme como um todo, que deixa a sutileza de lado como se esse conceito fosse inexistente – e isso é positivo.
Outra potência é a violência, personificada em Lou Sr. (Ed Harris), pai de Lou, dono do clube de tiro e criminoso. É ele a fonte da violência presente na vida de Lou e de sua irmã Beth (Jena Malone), que agora sofre violência doméstica de seu marido JJ (Dave Franco). O filme e a violência crescem no mesmo ritmo frenético em que crescem os músculos de Katy com o uso de esteróides, assim como os ciclos viciosos que trocam de símbolos, mas permanecem os mesmos e estão presentes em diferentes níveis para todos os personagens. A relação entre violência e amor, desejo, é mais aparente em Lou, e como ela lida com isso é uma das partes mais interessantes da história, fazendo um paralelo direto com seu vício em cigarros e sua incapacidade de se distanciar (ou ao menos querer se distanciar) do que tem o poder de lhe machucar. Por mais que esse não seja um filme de estudo de personagem, ainda leva à análises notáveis.
É com ousadia que Rose Glass escolhe representar o desenrolar da trama e sob o ponto de vista de Katy com as drogas, temos uma perspectiva mais lúdica dos acontecimentos; essa escolha do imaginativo chega perto de nos descolar da realidade do enredo, mas nunca chega a ultrapassar essa linha e o que temos, ao invés, é um filme incrivelmente criativo e com tudo para ganhar status de clássico.
Por Júlia Rezende