O Aprendiz
Diretor
Ali Abbasi
Gênero
Drama
Elenco
Sebastian Stan, Jeremy Strong, Maria Bakalova
Roteirista
Gabriel Sherman
Estúdio
Diamond Films
Duração
122 minutos
Data de lançamento
17 de outubro de 2024
“O Aprendiz” tem sido anunciado por seu marketing como um filme que Donald Trump não quer que você assista. Talvez esse realmente seja a melhor forma de vender um filme sobre uma das figuras mais polêmicas e polarizadas dos últimos tempos. Seria difícil pensar num filme sobre Trump que ele gostaria que as pessoas assistissem, já que uma breve busca no Google pode mostrar que, apesar de ter sustentado por muitos anos uma imagem de homem de sucesso, seu histórico traz muito mais escândalos e fracassos do que louros. No ano de uma eleição em que Trump tenta se eleger, mais uma vez, como presidente dos Estados Unidos, disputando voto a voto numa eleição que tem se mostrado acirradíssima, um filme como esse pode ter um pacto muito maior do que se tivesse sido lançado em outro momento, mas a maior chance é que só alcance o público que já tem uma certa aversão ao ex-presidente, principalmente considerando que o próprio Trump tentou barrar o filme diversas vezes, mas conseguindo apenas mais um fracasso.
Em vez de focar no Trump que conhecemos hoje em dia, “O Aprendiz” explora a ascensão de Trump (Sebastian Stan) no mundo dos negócios sob tutela do inescrupuloso John Chon (Jeremy Strong), advogado que ficou famoso nos anos 70/80 por sua influência, poder e brutalidade. A relação entre os dois, que começa como uma troca de favores, se intensifica ao longo dos anos e é aí que o filme se desenvolve. Acompanhamos o começo ambicioso de Trump, que queria sair da sombra de seu pai, também empresário do ramo de imobiliária, a qualquer custo e, no meio de um processo contra a empresa do pai, Trump conhece Chon e fica obcecado por sua imagem. Chon é tudo que Trump aspira ser, está sempre rodeado de pessoas influentes, frequenta os lugares mais exclusivos e mais importante: não é subordinado a ninguém. Cohn é um advogado, mas deixa bem claro que são os clientes que trabalham para ele, não o contrário.
O recorte abordado no filme de Ali Abbasi (de acordo com a produção, eles procuravam propositalmente um diretor não-estadounidense na esperança de produzir um filme menos partidário) é de um período-chave para entendermos o Trump de hoje e é tão “imparcial” quanto um filme sobre uma figura tão polêmica poderia ser. Mesmo com Cohn começando como uma espécie de vilão, é evidente que Trump não foi corrompido por ele – todos os traços da personalidade de Trump já estavam formados e foram apenas potencializados por Cohn. Até mesmo o primeiro processo que conectou os dois já demonstra o tipo de pessoa que era o empresário: a empresa da família estava sendo processada por cobrar mais caro de locatários negros, numa tentativa de mantê-los afastados de seus imóveis, algo que jamais foi negado por Trump e foi abraçado por Cohn, afinal de contas “ele tinha o direito de alugar para quem bem entedesse” – a relação entre os dois era baseada nos mesmos princípios.
Se Donald Trump não quer que você veja esse filme, é porque essa narrativa desconstrói a imagem de mito que ele tenta sustentar até hoje. Esse olhar mais próximo da relação com Cohn nos mostra que até as características mais próprias do ex-apresentador de programa de TV não são realmente dele, e sim cópias dos ensinamentos de Cohn. Seu casamento de décadas com Ivana Trump (interpretada por Maria Bakalova) também é reduzido a crises de ego por parte de Trump e grandes decepções por parte de Ivana e a imagem vaidosa de Trump é também desmontada, mostrando-o não como o mito que ele tenta ser, mas sim como o homem pouco brilhante que ele prova, constantemente, ser. Em uma janela de poucos anos, vemos a construção desse homem e o começo de seus fracassos, num ritmo fácil de se envolver, apesar da falta de surpresas. Se “O Aprendiz” não é um filme maravilhoso, isso diz muito menos sobre o talento da direção e as atuações de Sebastian Stan e Jeremy Strong (que estão ainda mais impressionantes do que costumam ser) e muito mais sobre o objeto do filme, que simplesmente não conseguiria ser mais interessante do que isso.
Por Júlia Rezende