Mais conhecida pela direção dos dois filmes ‘Meu Passado Me Condena’, a jovem carioca Julia Rezende, filha do também diretor Sérgio Rezende, reúne Ingrid Guimarães, Caco Ciocler e Domingos Montagner para mais uma comédia, no seu novo filme ‘Um Namorado Para Minha Mulher’, que é baseado em um filme argentino chamado ‘Um Novio Para Mi Mujer’, de 2008. No filme, Chico (Ciocler) é um marido calmo, mas que está insatisfeito com seu casamento com Nena (Ingrid), muito pelo fato do temperamento difícil de sua esposa, que está sempre reclamando de tudo, desde o clima até o signo das pessoas. Provocado pelos amigos a pedir o divórcio, Chico acaba encontrando uma solução bem inusitada para resolver o problema, contratando Corvo (Montagner), um homem misterioso para seduzi-la e fazer com que ela peça a separação.
Abordando o tema do desgaste que um casal sofre com o tempo em um casamento de longa data, o filme acerta por conseguir mostrar a relação entre Chico e Nena através de uma simples e animada abertura (que chega até a lembrar da novela ‘Malhação’), de forma muito direta e também já explicando a personalidade oposta dos dois personagens. Isso é positivo porque resolve essas questões fundamentais para a credibilidade da história em quinze ou vinte minutos, possibilitando o filme ter bastante tempo para desenvolver a narrativa a partir daí. A direção consegue fazer o dilema de Chico (e consequentemente a absurda decisão que ele irá tomar) plausível, pois sua característica de marido submisso e com saudade do passado é corroborada por sua própria profissão, pois tem uma loja de objetos antigos, indicando essa nostalgia saudosista, mas que não necessariamente é boa para ele – como indica uma cafeteira antiga que ele tem, mas que não sabe fazer café nela, então qual sua utilidade?
Nena e Corvo são outros personagens interessantes, sendo que Ingrid Guimarães de destaca bastante por proporcionar ao espectador um ângulo diferente da imagem com a qual provavelmente ela está acostumada, pois apesar de estar bastante engraçada como de costume, em ‘Um Namorado para Minha Mulher’ a atriz consegue passar veracidade ao interpretar uma mulher ‘amarga’ e sem papas na língua, e a contraposição com a personalidade de Chico é que proporciona alguns momentos e diálogos bem divertidos. Domingos também surpreende positivamente de forma inusitada, pois embora seu personagem não seja tão bem desenvolvido, é justamente esse mistério ao redor de Corvo, aliado a um ar sombrio do ator, que dá um toque até sinistro ao personagem, que também o torna engraçado e interessante. Já Caco tem alguns problemas como Chico, pois ao tentar passar a característica passiva e insegura do personagem, sua atuação incomoda um pouco por alguns maneirismos e trejeitos exagerados que o deixam um tanto caricato à primeira vista, mas que com o desenrolar do filme vão deixando de incomodar e o ator acaba convencendo no final das contas.
O filme tem poucos cenários, mas os utiliza muito bem, lembrando bastante a boa época das ‘screwball comedies’, ou comédias malucas, do auge dos anos 30, filmes que mostravam situações inusitadas dos pares românticos através de encontros e desencontros e muitas confusões. Mesmo seguindo a fórmula de Hollywood, de filmes como ‘Tratamento de Choque’ (2003), por exemplo, o roteiro – apesar de um tanto previsível – utiliza muito bem os clichês e convenções do gênero a seu favor, pois enquanto há a famigerada e batida ideia de que o mau humor da mulher se dê por falta de sexo, por outro, a ‘sátira’ que o filme faz aos “youtubers” que alcançam um sucesso absurdo de visualizações e seguidores por ‘cuspir marimbondos’, falando mal de tudo e de todos para uma câmera é hilária, e de novo, Ingrid é a responsável pelo sucesso nesse sentido, pois sua interpretação nessas cenas é muito crível.
Portanto, ‘Um Namorado para Minha Mulher’ pode ser considerado uma grata surpresa dentro do cinema de comédia nacional nos últimos anos. Apesar do último terço ficar muito tenso, destoando bastante do tom cômico que vinha sendo construído até o momento, a mensagem do distanciamento do casal, da covardia dos cônjuges e da acomodação que prejudica o relacionamento é muito bem abordada e convincente, dentro do universo diegético estabelecido pelo filme. Talvez falte um pouco de sensibilidade para tornar o desfecho mais leve, pois em uma comédia – como ensinou Aristóteles na Poética – o espectador tem que sair se sentindo positivo, com o ânimo renovado, e a direção de Júlia, embora pese um pouquinho a mão quando precisa injetar uma carga mais dramática ao filme, consegue relativamente recuperar o bom astral para que o epílogo possa ser satisfatório. Com a união de boas e engraçadas atuações, com um roteiro formulaico e um tanto previsível, mas bem amarrado, o filme tem tudo para agradar tanto o público mais jovem como também dar uma ‘sacudida’ nos casais de longa data que estão ficando acomodados por aí.